domingo, 30 de maio de 2010

O grande romântico do século 20

Um dos mais refinados pianistas de seu tempo, o russo Sergei Rachmaninov foi um dos últimos representantes do romantismo tardio. Apaixonado pela Escola Russa de Composição, principalmente pela obra de Tchaikovsky e de Korsakov, Rachmaninov foi encontrando com o tempo o seu próprio idioma: lírico, romântico e expressivo.

Ele viveu situações paradoxais: esbanjava talento compondo ou tocando, mas não dispunha da mesma facilidade para manter o equilíbrio emocional. Por causa disso, ficou muito tempo sem tocar ou compor e só voltou à ativa graças a uma terapia de auto-sugestão. Depois da Revolução Russa, foi para os Estados Unidos, onde permaneceu até a morte. Em mais de 25 anos de “exílio”, compôs somente seis peças.

Sua expressividade e elegância ao piano o colocaram em posição de destaque no cenário musical. Sua escrita, no entanto, era muito criticada pelos grandes compositores e intelectuais da época. Não raramente, ele era chamado de antiquado ou démodé. Porém o lirismo de sua música e suas melodias tocavam a todos os ouvintes, assim como suas harmonias amplas e a orquestração requintada e brilhante. Hollywood colocou uma de suas obras mais célebres, a Rapsódia Sobre um Tema de Paganini, no topo dos grandes sucessos da década de 1980, ao incluí-la na trilha do filme Em Algum Lugar do Passado.

O número de compositores eruditos que foram injustiçados impressiona. Assim como muitos que o antecederam e o sucederam, Rachmaninov também sofreu em sua época com sentenças desmedidas dos críticos e formadores de opinião. Entre as principais injustiças cometidas contra ele, duas merecem maior destaque.

A primeira foi o fato de Rachmaninov não ter sido considerado um compositor completo para orquestras. Isso teve grandes implicações na vida do também pianista e regente. No dia 15 de março de 1897, a estréia de sua primeira sinfonia, a Sinfonia número 1 em Ré Bemol Op. 13, foi um fracasso. O músico, acostumado com os elogios que recebera durante os anos de estudo em Moscou e em São Petersburgo, não soube lidar com as críticas, entrando em depressão profunda, doença que durante muitos anos relegou sua vida e sua carreira ao ostracismo. Rachmaninov somente conseguiria superar o problema com um tratamento de hipnose do psiquiatra russo Nikolai Dahl. A segunda rotulação, de acordo com a qual suas obras pianísticas seriam apenas mera exibição da técnica apurada de um virtuose sem sentimentos, também é injusta. O Concerto número 3 para Piano em Ré Bemol, pelo contrário, demonstra que Rachmaninov não era apenas um “tecnocrata” a serviço da música.

Dos quatro concertos para piano, o terceiro, feito em 1909, recebe esse estigma por, de fato, exigir domínio completo da técnica para ser executado. Mas não pode ser encarado com tamanho reducionismo. O próprio compositor declarou sobre sua obra: “Ao escrever minha música, eu tento constantemente dizer da maneira mais simples e direta o que está em meu coração. Seja amor, amargura, sofrimento ou religião; esses sentimentos tornam-se partes de minha música, e ela se torna bela, amarga, triste ou religiosa”. No concerto, de maneira claramente premeditada, a orquestra faz um pano de fundo nos principais momentos de tensão, respeita o desenvolvimento melódico e harmônico feito pelo piano, aparecendo com intensidade sempre no fim dos três movimentos (allegro ma non tanto, adagio e finale).

Recebido com sucesso no dia 28 de outubro de 1909, em Nova York, o Concerto número 3 para Piano em Ré Bemol abriu as portas para Rachmaninov nos Estados Unidos. No fim da vida, o compositor foi muito criticado nos Estados Unidos, por se apresentar em concertos beneficentes em favor do fundo de guerra soviético – mesmo a URSS sendo, na Segunda Guerra, aliada dos estadunidenses. “Eu continuo sendo russo, e para mim, é natural dar apoio ao meu país”, defendia-se. Ideologicamente abalado ou não, a verdade é que suas composições entraram em declínio no território ianque.

Ouvir Rachmaninov é entrar em um mundo muito pessoal, que tem como base a música russa dos seus mais célebres criadores, porém com a personalidade de um gênio do piano, que, felizmente, graças à época em que viveu, podemos ouvir em gravações históricas e inesquecíveis. Sinta o toque delicado, profundo e apaixonado desse grande compositor russo no Concerto para Piano número 3:

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