segunda-feira, 31 de maio de 2010

O exagerado Berlioz

“Romântico? Não sei o que isso significa. Sou um clássico. Por clássico, entendo uma arte jovem, vigorosa, sincera, apaixonada, amante das belas formas, perfeitamente livre. Tudo aquilo que já foi produzido de grande, de corajoso: Gluck, Beethoven, Shakespeare.” A frase de Louis Hector Berlioz resume sua criação musical, quase sempre excessiva e de inventividade superior. E, apesar de negar, ele encarnou o protótipo do artista romântico, ao lado de Victor Hugo e Eugène Delacroix. Foi o poeta e escritor Théophile Gautier quem juntou o compositor, o romancista e o pintor, todos franceses, no que chamou de “santa trindade da arte romântica”.

Assim como Wagner, Mendelssohn, Tchaikovsky e Mahler, Berlioz foi muito respeitado como regente não somente de suas obras mas também de outros compositores. Dedicou-se à ópera e à música sinfônica, regendo com freqüência na Alemanha e Inglaterra, além da França. Deixou um importante legado para os futuros regentes ao escrever sobre as características dessa nova função e sobre a moderna orquestração. Seu tratado sobre a matéria é, até hoje, uma referência para alunos de qualquer escola de música.

Artista de seu tempo, Berlioz foi ligado ao movimento romântico francês e se tornou amigo de escritores como Alexandre Dumas, Balzac e Victor Hugo. A literatura é latente no trabalho do compositor. Muitas de suas melhores peças têm conexão literária. Para escrever A Danação de Fausto, ele se baseou em Fausto, de Goethe; para O Rei Lear, na obra homônima de Shakespeare; para Haroldo na Itália, em Childe Harold’s Pilgrimage, de Lord Byron; e, para Les Troyens, em Eneida, de Virgílio. Shakespeare aparece ainda como base para duas composições de grande relevância: o balé Romeu e Julieta e Béatrice et Bénédict.

Sua obra é cheia de contrastes, mudanças de clima e tempo, com uma orquestração rica, criativa e inovadora. Sua Sinfonia Fantástica é um belo exemplo. Além do uso de duas harpas, corne-inglês e campanas, essa é uma obra programática, ou seja, baseada em um texto que narra “episódios na vida de um artista”, como diz seu subtítulo. Berlioz colocou na peça muitos aspectos pessoais. Na época, ele vivia uma grande paixão pela atriz Harriet Smithson. Essa composição simboliza o nascimento do romantismo na França e da música programática, que seguiria com grande brilho pelas mãos de Liszt e Tchaikovsky.

No dia 11 de setembro de 1827, Berlioz assistiu a uma encenação de Hamlet, a mais celebrada peça de William Shakespeare. Mais do que prestar atenção ao drama, Berlioz fixou-se na beleza da famosa atriz irlandesa Harriet Smithson, que interpretava a personagem Ofélia. Mesmo não a conhecendo naquele momento, já que, logo após a apresentação, ela deixara Paris, a paixão foi instantânea. Harriet, com quem o compositor teria um casamento desastroso seis anos depois, foi a principal inspiração da criação mais famosa do compositor, a Sinfonia Fantástica, opus 14, também conhecida como Episódio da Vida de um Artista.

A obra foi composta em 1830 e apresentada pela primeira vez no Conservatório de Paris, no dia 5 de dezembro do mesmo ano, sob regência do maestro François-Antoine Habeneck. Após a estréia, Berlioz a revisaria exaustivamente até apresentá-la em seu formato definitivo, em 1845. A sinfonia é um marco do romantismo francês e apresenta diversas inovações para esse período, como ter tornado a experiência pessoal do artista fundamental para a composição. As paixões extremadas de Berlioz, que beiravam a loucura, o situam como um dos principais criadores do movimento romântico europeu.

Na Sinfonia Fantástica, Berlioz oferece ao ouvinte um programa (ou tema não musical) que descreve as sensações de um “jovem poeta possuído por uma onda de paixão”. No desespero de encontrar a amada, consome ópio, e as alucinações resultantes da experiência são contadas nos cinco movimentos que integram a composição. Berlioz, dessa forma, desobedece à estrutura formal da sinfonia ao acrescentar um movimento, o que não era comum até então, e inaugura uma música programática totalmente instrumental. Como o próprio francês gostava de frisar, a existência do tema não musical é indispensável para a total compreensão do plano dramático da obra. Mais do que qualquer outro compositor, Berlioz escrevia música estimulado por impressões literárias.

Outra marca relevante da Sinfonia Fantástica é a utilização de um motivo melódico que se repete e representa a amada do jovem poeta. Com o intuito de unificar os cinco movimentos da sinfonia, o compositor utiliza-se de uma idéia fixa (tema musical recorrente) que retorna em movimentos específicos e com variações. Com a Sinfonia Fantástica, Berlioz colaborou com a evolução do som da orquestra e impulsionou o progresso da música descritiva (a que ilustra personagens ou lugares) e pictórica (voltada para o estímulo das impressões sensoriais do ouvinte), o que influenciaria de maneira decisiva outros compositores. Apesar da genialidade, Berlioz nunca alcançou o sucesso e o reconhecimento em vida. Morreu pobre e absolutamente infeliz.

Sinfonia Fantástica, opus 14 – Episódio da Vida de um Artista
Texto de Hector Berlioz

Um jovem músico de sensibilidade doentia e imaginação ardente envenena-se com o ópio em um acesso de desespero amoroso. A dose do narcótico, fraca demais para levá-lo à morte, mergulha-o em um pesado sono, acompanhado das mais estranhas visões. Enquanto dorme, sensações, sentimentos e lembranças se traduzem, em seu cérebro doentio, em pensamentos e imagens musicais. A mulher amada tornou-se para ele uma melodia, como uma idéia fixa, que ele reencontra e ouve em todo lugar.

Primeira Parte: Devaneios, Paixões

Acima de tudo, ele se lembra do mal-estar da alma, da onda de paixões, da melancolia e das alegrias sem causa que experimentou antes da visão da mulher amada. Depois, do amor vulcânico que ela de súbito lhe inspirou, de suas delirantes angústias, dos furores de ciúme, do retorno da ternura e das consolações religiosas.

Segunda Parte: Um Baile

Ele reencontra a amada durante um baile que acontece numa majestosa festa.

Terceira Parte: Cena no Campo

Em uma noite de verão no campo, o jovem ouve dois pastores dialogando por meio de uma melodia rústica. Esse duo pastoral, o local da cena, o leve murmúrio das árvores docemente agitadas pelo vento, certa esperança que sentiu há pouco – tudo contribui para conferir uma calma incomum a seu coração e mais alegria a suas idéias. Mas ela reaparece e seu coração se parte. Dolorosos pressentimentos o agitam: se ela o enganasse... Um dos pastores retoma a ingênua melodia, mas o outro já não responde. O sol se esconde... Ruído distante de trovão... Solidão... Silêncio.

Quarta Parte: Marcha para o Suplício

Ele sonha que matou a mulher amada e que, condenado à morte, caminha para o suplício. O cortejo avança ao som de uma marcha ao mesmo tempo sombria e feroz, tão brilhante como solene, na qual um ruído surdo de passos graves sucede sem transição a cintilantes relâmpagos. No final, a idéia fixa aparece por um instante, como um último pensamento amoroso, interrompida pelo golpe fatal.

Quinta Parte: Sonho de uma Noite de Sabá

O herói vê-se num sabá, no meio de uma tropa ameaçadora de sombras, feiticeiras e monstros de todo tipo, reunidos para o seu funeral. Ruídos estranhos, gemidos, gargalhadas; gritos distantes aos quais outros gritos parecem responder. A melodia amada aparece novamente, mas perdeu seu caráter de nobreza e timidez. Agora, não é mais do que uma melodiazinha de dança ignóbil, trivial e grotesca. É ela que vem ao sabá... Estrondos de alegria em sua chegada... Ela mistura-se à orgia diabólica... Dobre de finados, paródia burlesca do Dies Irae. Ronda do Sabá, Ronda do Sabá e Dies Irae juntos.



domingo, 30 de maio de 2010

O grande romântico do século 20

Um dos mais refinados pianistas de seu tempo, o russo Sergei Rachmaninov foi um dos últimos representantes do romantismo tardio. Apaixonado pela Escola Russa de Composição, principalmente pela obra de Tchaikovsky e de Korsakov, Rachmaninov foi encontrando com o tempo o seu próprio idioma: lírico, romântico e expressivo.

Ele viveu situações paradoxais: esbanjava talento compondo ou tocando, mas não dispunha da mesma facilidade para manter o equilíbrio emocional. Por causa disso, ficou muito tempo sem tocar ou compor e só voltou à ativa graças a uma terapia de auto-sugestão. Depois da Revolução Russa, foi para os Estados Unidos, onde permaneceu até a morte. Em mais de 25 anos de “exílio”, compôs somente seis peças.

Sua expressividade e elegância ao piano o colocaram em posição de destaque no cenário musical. Sua escrita, no entanto, era muito criticada pelos grandes compositores e intelectuais da época. Não raramente, ele era chamado de antiquado ou démodé. Porém o lirismo de sua música e suas melodias tocavam a todos os ouvintes, assim como suas harmonias amplas e a orquestração requintada e brilhante. Hollywood colocou uma de suas obras mais célebres, a Rapsódia Sobre um Tema de Paganini, no topo dos grandes sucessos da década de 1980, ao incluí-la na trilha do filme Em Algum Lugar do Passado.

O número de compositores eruditos que foram injustiçados impressiona. Assim como muitos que o antecederam e o sucederam, Rachmaninov também sofreu em sua época com sentenças desmedidas dos críticos e formadores de opinião. Entre as principais injustiças cometidas contra ele, duas merecem maior destaque.

A primeira foi o fato de Rachmaninov não ter sido considerado um compositor completo para orquestras. Isso teve grandes implicações na vida do também pianista e regente. No dia 15 de março de 1897, a estréia de sua primeira sinfonia, a Sinfonia número 1 em Ré Bemol Op. 13, foi um fracasso. O músico, acostumado com os elogios que recebera durante os anos de estudo em Moscou e em São Petersburgo, não soube lidar com as críticas, entrando em depressão profunda, doença que durante muitos anos relegou sua vida e sua carreira ao ostracismo. Rachmaninov somente conseguiria superar o problema com um tratamento de hipnose do psiquiatra russo Nikolai Dahl. A segunda rotulação, de acordo com a qual suas obras pianísticas seriam apenas mera exibição da técnica apurada de um virtuose sem sentimentos, também é injusta. O Concerto número 3 para Piano em Ré Bemol, pelo contrário, demonstra que Rachmaninov não era apenas um “tecnocrata” a serviço da música.

Dos quatro concertos para piano, o terceiro, feito em 1909, recebe esse estigma por, de fato, exigir domínio completo da técnica para ser executado. Mas não pode ser encarado com tamanho reducionismo. O próprio compositor declarou sobre sua obra: “Ao escrever minha música, eu tento constantemente dizer da maneira mais simples e direta o que está em meu coração. Seja amor, amargura, sofrimento ou religião; esses sentimentos tornam-se partes de minha música, e ela se torna bela, amarga, triste ou religiosa”. No concerto, de maneira claramente premeditada, a orquestra faz um pano de fundo nos principais momentos de tensão, respeita o desenvolvimento melódico e harmônico feito pelo piano, aparecendo com intensidade sempre no fim dos três movimentos (allegro ma non tanto, adagio e finale).

Recebido com sucesso no dia 28 de outubro de 1909, em Nova York, o Concerto número 3 para Piano em Ré Bemol abriu as portas para Rachmaninov nos Estados Unidos. No fim da vida, o compositor foi muito criticado nos Estados Unidos, por se apresentar em concertos beneficentes em favor do fundo de guerra soviético – mesmo a URSS sendo, na Segunda Guerra, aliada dos estadunidenses. “Eu continuo sendo russo, e para mim, é natural dar apoio ao meu país”, defendia-se. Ideologicamente abalado ou não, a verdade é que suas composições entraram em declínio no território ianque.

Ouvir Rachmaninov é entrar em um mundo muito pessoal, que tem como base a música russa dos seus mais célebres criadores, porém com a personalidade de um gênio do piano, que, felizmente, graças à época em que viveu, podemos ouvir em gravações históricas e inesquecíveis. Sinta o toque delicado, profundo e apaixonado desse grande compositor russo no Concerto para Piano número 3:

sábado, 29 de maio de 2010

Acorda Finlândia!

Apesar de pertencer a uma família que tinha como idioma de costume o sueco, Jean Sibelius utilizou-se de seu fervoroso nacionalismo finlandês para criar boa parte de suas obras. A composição que mais denota esse espírito patriótico é o poema sinfônico Finlândia, composto em 1899 e revisto pelo autor no ano seguinte. Sibelius, apesar da dificuldade em falar o finlandês, inspirou-se na luta pela independência de seu país contra o domínio sueco e a influência russa. Subjugada por essas duas nações, a Finlândia não possuía identidade cultural, que seria construída com a contribuição decisiva do compositor.

A peça, que inicialmente se intitulava Acorda Finlândia, causou profundo impacto na sociedade do país e alimentou a resistência contra o crescente domínio do czar russo Nicolau II. Apesar de considerada um poema sinfônico, Finlândia não tem um programa explícito e concreto que assim a defina. Sabe-se apenas que se trata de um grito de liberdade em busca da soberania nacional. O próprio Sibelius negava a idéia literária em suas obras: “São músicas imaginadas e escritas como expressão musical sem nenhum fundamento literário. Não sou um músico de literatura: para mim, a música começa onde termina a palavra”.

Finlândia é composta de um movimento e contém as características típicas de um hino nacional: notas elevadas de coral, melodias quase épicas e trechos retumbantes de fanfarras que exploram de forma intensa os metais. O início da peça é turbulento e tenso, representando a luta do povo, seguido por uma calma e uma serenidade que invadem a música para introduzir um trecho festivo, quase de comemoração. É o caminho que, na visão de Sibelius, o povo finlandês teria de percorrer para chegar à liberdade.

Assim como em suas sete sinfonias e em outras obras de sua autoria, o compositor procurou ilustrar também a natureza gélida e os extensos lagos sombrios e monótonos de sua terra. Em Finlândia, porém, não são perceptíveis traços da música folclórica, algo comum entre os compositores do norte europeu da época. Sibelius, influenciado por seus antecessores, representava a resistência do romantismo, que já chegava ao fim. Foi tachado de conservador. A solidez admirável de suas obras representa, para muitos especialistas, um romantismo anacrônico que evita as inovações naturais impostas no período pela música moderna de Gustav Mahler.

Alheio aos críticos, Sibelius testemunharia a independência de seu país apenas em 1917, durante a revolução bolchevique na Rússia. Em 1941, veria sua obra Finlândia se tornar definitivamente o hino extra-oficial da nação que tanto amava. Durante a Segunda Guerra Mundial, após a invasão da Finlândia pela Rússia, o poeta finlandês Antero Veikko Koskenniemi escreveu um texto para o poema sinfônico de Sibelius, que logo criou um arranjo para o coro. Com letra, a peça se configurou ainda mais como hino.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Oficina entrevista: Daniely Araújo

Na penúltima entrevista da nossa série, trazemos Daniely Araújo. Daniely é estudante de Jornalismo na Unifor e também estuda Letras Francês na UFC, além de gostar dos mesmos seriados que eu e me passar todos os acontecimentos dos episódios que não assito (hahaha); valeu, Daniely! Então, vamos às respostas:

OR: Como/Por que você começou a gostar de música?
DA: Bem, eu praticamente sempre me lembro de música na minha vida, desde bem bebê. A minha babá era uma pessoa totalmente viciada em música e sempre ficava tomando conta de mim ou me pondo pra dormir enquanto arrumava a casa ou fazia outra tarefa doméstica com o rádio ligado, então pelas minhas lembranças desde criança sempre ouvia Menina Veneno e outras músicas do Ritchie, o que me fizeram até hoje gostar bastante dele.

OR: Qual seu estilo musical favorito?
DA: eu tenho um gosto bem eclético pra música, tem pouca coisa que não gosto, mas o principal estilo é uma mistura de Rock e Pop.

OR: Cantores (as), grupos e (ou) bandas favoritos (as)
DA: Bandas, bem tenho entre as minhas favoritas Depeche Mode, Cold Play, Green Day, Lacuna Coil, Paramore, Legião Urbana, Engenheiros do Havaí, Biquíni Cavadão, Capital Inicial e Pato Fu.

OR: Com que freqüência escuta música? Como (mp3, cd, rádio, etc.)?
DA: Escuto música a todo segundo que não estou fazendo nenhum trabalho nem em aula, meu mp3 está sempre comigo em todo lugar, e fico ouvindo nos intervalos das aulas, no ônibus, em casa escuto música no computador o dia todo, até mesmo assistindo tevê também as vezes fico ouvindo música baixinho.

OR: Como adquire as músicas? Compra? Em que formato (cd, mp3)?
DA: Depende, compro alguns cds que me interessam mais em sentido de ser pra minha coleção, mas as pro meu mp3 eu baixo na internet no Myspace já que várias bandas disponibilizam o cd inteiro pra ser baixado e dá pra conhecer muita coisa nova e interessante, já virei fã de várias bandas através de ouvir no Myspace.

OR: Qual sua música preferida? Por que?
DA: Eu tenho fases, e em cada uma dessas fases eu tive uma música favorita, mas entre todas elas, acho que Heaven do Bryan Adams é a minha favorita, porque me lembra de vários momentos bons da minha vida que já passei enquanto escutava essa música.

OR: Qual sua opinião sobre a pirataria e o download ilegal pela Internet?
DA: Eu acho que hoje em dia a Internet é a principal ferramenta pra divulgar e conseguir músicas e ninguém vai mudar isso, as gravadoras tem que simplesmente aceitarem e se modernizarem levando pra rede um serviço diferenciado que as faça ganhar frente aos sites concorrentes.

OR: Costuma ir a shows? Se sim, com que freqüência? Se não, por que?
DA: Costumo, é sempre melhor ouvir ao vivo a sua banda, sentir a emoção de estar perto e ouvindo a música ali “de cara” com você. Normalmente vou a muitos shows nas férias, chego até a viajar pra outros estados, mas no período de aulas não costumo ter muito tempo pra mais nada além da faculdade.

OR: Toca algum instrumento? Canta? Compõe? Exerce alguma atividade artística (pintura, desenho, etc.)?
DA: Bem se escrever contos e poesias estiver dentro da lista de atividades artísticas, sou uma profunda apaixonada por música e pretendo começar aulas de piano ou violino até o fim do ano, quando terminar o curso de francês meu tempo livre estiver mais organizado.

OR: Estilo de música do qual não gosta. Por que?
DA: Não gosto de forró porque a grande maioria das músicas depreciam a mulher em suas letras.

OR: Fones de ouvido ou som alto?
DA: Fones de ouvido com certeza, ninguém tem obrigação de ouvir a mesma música que eu...

OR: Dê uma dica musical (artista, música, etc.)
DA: Bem, Depeche Mode não é uma banda tão conhecida, então a minha dica é a música Enjoy the silence, ela foi considerada por vários críticos de música como uma das mais belas melodias feitas em todos os tempos, e elogios da crítica a parte, a canção te faz mesmo viajar pra outro mundo.

OR: Pra mim, música é...
DA: Vida. A minha vida pelo menos sempre esteve embalada pela música, até brinco algumas vezes que tenho minha própria trilha sonora como num filme. A música está em tudo pra mim, até quando não estou ouvindo música estou pensando em alguma letra de música, então ela está comigo o tempo todo.

Bom, gostaria de pôr o vídeo de Heaven, de Bryan Adams, canção preferida da nossa entrevistada, mas não consegui incorporar. Então, veja o clipe de Viva La Vida, da banda britânica Coldplay, que é uma das preferidas da Daniely:

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Canção de amor do tropicalismo

Canção de amor pop que projetou a voz de Gal Costa país afora, Baby foi composta por Caetano Veloso em 1968. A cantora gravou-a no LP Panis et Circensis, que lançaria a tropicália, e aderiu ao movimento liderado por Caetano e Gilberto Gil, adotando cabeleira vasta e roupas extravagantes. Logo antes, ela abandonara o nome de batismo, Maria da Graça, por sugestão de Guilherme Araújo, empresário de seus conterrâneos e companheiros de movimento.

No ano anterior, a cantora havia lançado, com Caetano, o disco Domingo, que tornara seu novo nome conhecido. Naquele mesmo ano, Maria Bethânia pediu a seu irmão Caetano que compusesse uma canção que incluísse a declaração de amor “Baby, I Love you”. O compositor fez a música, com arranjos de Rogério Duprat, e a guardou para a gravação do LP que vinha planejando com Gil, Duprat e outros tropicalistas. Mas, quando chegou o momento de entrar no estúdio, Bethânia decidiu não gravar porque não queria associar-se a movimentos ou militâncias. Assim, Gal pôde lançar Baby e fazer da canção seu primeiro hit.

O estilo bossa-novista de Gal Costa, que tinha João Gilberto como principal referência, é uma das marcas da gravação. De acordo com a receita tropicalista de misturar influências, Baby também incorpora o iê-iê-iê de Roberto Carlos, com a menção à “canção do Roberto”, e o pop internacional: Caetano cita em contracanto, ao fim da música, o verso “Please, stay by me, Diana”, de Diana, grande sucesso do estadunidense Paul Anka no fim da década de 1950.

A cultura de massas e de consumo, que chegava ao Brasil com força crescente, junto com o aumento da influência estadunidense – expresso já no título da canção -, inspira as referências da letra a “margarina” e “gasolina”. Repleta de elementos dissonantemente prosaicos, Baby desloca o lirismo das canções de amor para o contexto múltiplo, dinâmico e contraditório de uma urbanidade em expansão e transformação aceleradas.

Parecendo passear pela metrópole, a canção fala da “piscina” e da “lanchonete” e, como que a captar a euforia do milagre brasileiro, que ganharia força e embalaria promessas de modernização e desenvolvimento nos anos seguintes, chama São Paulo de “a melhor cidade da América do Sul”.

Logo depois, quando Caetano e Gil foram para o exílio na Inglaterra, em 1968, Gal permaneceu no Brasil e se aproximou de artistas como Jards Macalé e Jorge Mautner. Em 1971, sob direção do poeta Waly Salomão, estrelou o show Gal a Todo Vapor, que a sagrou como uma espécie de musa hippie brasileira. Cinco anos depois, novamente na campanha de Caetano, Gil e Bethânia, Gal protagonizou outro momento apoteótico da contracultura em terras tropicais: o show Doces Bárbaros, que, a exemplo de A Todo Vapor, renderia a gravação de um disco com o mesmo nome.

No fim da década de 1970, a carreira de Gal começaria a se desviar para outros caminhos, incorporando outros compositores e gêneros, sobretudo sambas e boleros, e afastando-se da herança tropicalista. Com a mudança, a cantora ampliou seu público e atingiu vendagens cada vez maiores.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Entre dois mundos

A música do século 20 começou com Richard Strauss. Foi ele quem rompeu diques, desafiou preconceitos e abriu portas para o exercício criativo totalmente livre, condição de que hoje desfrutam os compositores contemporâneos.

Richard Strauss começou a estudar música cedo graças ao pai, que era primeiro trompista da Orquestra da Ópera de Munique, na Alemanha. O garoto logo mostrou talento como intérprete e também como compositor. Até os 20 anos, suas maiores influências foram Mozart, Brahms e Berlioz. Mas, depois de conhecer o violinista Alexander Ritter, um defensor do drama de Wagner e dos poemas sinfônicos de Liszt, sua escrita sofreu uma grande transformação. A dupla se encontrou na Orquestra de Meiningen, onde Strauss era assistente do maestro Hans von Büllow, e Ritter, o spalla.

Strauss foi um dos mais importantes regentes de sua época – ele se tornou titular em Meiningen e foi diretor musical das Óperas de Weimar, Berlim e Viena. Suas interpretações são documentos históricos para estudiosos e amantes da música. Sua atuação abrange os séculos 19 e 20, trazendo influências do período romântico, principalmente de regentes como Hans von Büllow, Hermann Levi e Arthur Nikisch, e do início do século. Felizmente, graças ao advento da gravação, podemos hoje ouvir suas interpretações.

Seus gestos eram comedidos. Sua postura frente à orquestra era classificada por alguns como fria, mas não a sua música. Ela é viva, com uma orquestração brilhante, ousada, moderna. Suas obras são cheias de influências teatrais. Não por acaso, acabou eternizado por suas óperas e seus poemas sinfônicos, que sempre encantam as platéias.

Richard Strauss revolucionou a música sem ser um revolucionário. Levou o romantismo ao limite e foi essencial, ao lado de outros grandes regentes e compositores da época, na formação das bases da regência moderna.

O mais conhecido poema sinfônico de Strauss representa uma das vertentes pós-românticas da virada do século 19 para o 20. Ainda que de modo distinto, a obra do compositor definiu, com a do austríaco Gustav Mahler, novos caminhos para uma tradição sinfônica germânica à beira do colapso.

Para os críticos, Assim Falou Zaratustra apela para o bombástico ou para o banal. Os apreciadores, no entanto, compreenderam a renovação por trás da grandiloqüência da obra. Admirador do compatriota, Richard Wagner, Strauss mostra aqui, pela primeira vez, sua predileção por grandes contingentes orquestrais e pelo impacto sonoro. Sua experiência como regente e o pleno desenvolvimento da orquestra sinfônica na época possibilitaram o aumento da expressividade das obras eruditas. Graças ao aprimoramento dos instrumentos de pistão, como as trompas e os trompetes, Assim Falou Zaratustra consegue aliar força e requinte nas partes mais grandiosas.

Assim Falou Zaratustra, obra baseada no livro homônimo de Friedrich Nietzsche, segue o desenvolvimento do livro, ilustrando a trajetória evolutiva do ancestral para o homem e deste para o super-homem. Conceitos e temas como a aspiração suprema, o papel da ciência e o andarilho noturno dão nome às partes da obra. A potência e o heroísmo dessa trajetória aparecem na introdução imponente. O tema apresentado no início tornou-se conhecido do grande público ao acompanhar magistralmente a cena de abertura do filme 2001 – Uma Odisséia no Espaço, do cineasta Stanley Kubrick. Graças a essa projeção, a composição, que na sua época contou com a ajuda da obra de Nietzsche para se popularizar, agora é mais familiar do que o livro do filósofo alemão.

terça-feira, 25 de maio de 2010

Viver através da música

Uma vida dedicada à música. Trabalho árduo de anos que hoje é referência e motivo de orgulho. Essa é a vida de Miguel Ângelo de Azevedo, mais conhecido como Nirez. Dono de 22 mil discos de cera e outros documentos raríssimos como fotografias de artistas e livros que também falam sobre a música brasileira, além de aparelhos de rádio, telefones e outras tantas coisas, o arquivo Nirez, se tornou uma referência nacional para pesquisadores, estudiosos, interessados e curiosos da música brasileira. Em entrevista para a Oficina da Radiola, o jornalista, que já trabalhou em vários meios de comunicação no Ceará, nos fala sobre como começou a montar sua coleção e o que espera que aconteça com o acervo no futuro, entre outros assuntos.

“Na verdade, eu não tinha o intuito de ser colecionador. Me deram um presente em 1954, quando eu tinha 20 anos, um toca disco, daqueles antigos. Aí eu comecei a comprar disco”, assim começou o que atualmente é um dos maiores acervos sobre música no Brasil. Nirez, hoje diretor do Museu da Imagem e do Som, diz que enfrentou dificuldades para adquirir alguns de seus discos. A partir de 1958, quando, segundo ele, começou a comprar e colecionar os discos com todo o rigor, às vezes, suas pesquisas o levavam até as casas de famílias que não queriam se desfazer dos objetos. Para convencê-los, nada como uma boa conversa ou mesmo uma boa lábia.

O colecionador também conta que à medida que ia comprando discos, seu interesse pelos artistas também crescia: “Paralelamente, crescia o meu interesse em saber quem eram aquelas pessoas que povoavam os discos. Cantores, músicos, os autores; eu fui adquirindo uma biblioteca, comprando livros. Então, formei uma biblioteca em função da discoteca”, relembra o homem que desde menino gostava de colecionar caixas de fósforo, carteiras de cigarro, etc., e que, aos poucos, também foi tomando gosto por fotografias antigas de Fortaleza: “Depois, me apaixonei pelas fotos antigas de Fortaleza e comecei um acervo de fotos antigas e como ninguém colecionava nessa época, foi relativamente fácil (adquirir as fotos)”. Na época em que trabalhou no jornal O Povo, muitos leitores mandavam fotos de Fortaleza para o jornalista que as publicava ao lado de outras mais recentes do mesmo local para fazer comparações.

Sobre o futuro do acervo, Nirez diz que está em negociação, através do Ministério da Cultura (MinC) e a Petrobrás, para colocar no ar um site disponibilizando as músicas, as fotografias e os textos que fazem parte de sua coleção. Nirez ainda nos assegura de que não se preocupa com o rumo que o acervo possa tomar no futuro por que o trabalho que ele podia fazer, já o fez. Hoje, o Arquivo Nirez é sustentado pela Sociedade de Pesquisa e Administração de Museu que conta ao todo com 12 sócios.

Para Nirez, o trabalho de colecionador é, ao mesmo tempo, gratificante e de grande responsabilidade. Para provar as duas coisas, nos narra o seguinte caso: “O que mais me gratifica hoje é o que aconteceu na semana passada. Uma moça mandou uma mensagem dizendo que viu no meu site que tenho a primeira gravação da cantora Marília Batista. Ela disse que procurou esse disco em todos os lugares possíveis e não encontrou, apenas no meu site. Então eu mandei as canções para ela. E ela mandou um e-mail agradecendo. Isso é confortante, não é?”, afirma dizendo ainda que encara seus discos como se fossem seus filhos.

Serviço
Arquivo Nirez:
Rua Prof. João Bosco, 560
Bairro Rodolfo Teófilo
Fone: 32816949

Museu da Imagem e do Som:
Av. Barão de Studart, 410
Meireles
Fone: 31011202

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Hoje é o Dia Nacional do Cigano

Pessoal

Pra quem não sabe, 24 de maio é o Dia Nacional do Cigano. A data foi instituída em 2006 pelo presidente Lula.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), vivem hoje no Brasil 800 mil ciganos. Cerca de 80% deles são analfabetos e uma parcela significativa é nômade. Apesar da homenagem, é preciso lembrar que o povo cigano é um dos que mais sofrem com a discriminação e o preconceito no mundo.

E isso precisa mudar. Também por falta de informação, muita gente continua com ideias errôneas sobre esse povo tão especial. É preciso saber que os ciganos têm histórias e culturas diversas e riquíssima, infelizmente ainda desconhecidas por nós, brasileiros.

Faço minha homenagem ao povo cigano trazendo "Volare", do grupo Gipsy Kings, um dos ícones da música cigana. Vou escrever um post completo sobre ele em breve. Por enquanto, saboreie esse clássico:

Oficina entrevista: Wesley Lima

Continuando nossa série de entrevistas, trazemos o estudante de Direito, Wesley Lima. Cara gente boa e quem compartilha conosco suas opiniões e preferências musicais hoje. Vamos à elas:

OR: Como/Por que você começou a gostar de música?
WL: Ouvindo bandas que meus amigos, na adolescência, me apresentavam. Ouvir música é um momento de reflexão, de sonhar com o futuro, daí veio o sentimento de gostar de música.

OR: Qual seu estilo musical favorito?
WL: Rock e derivados em geral

OR: Cantores (as), grupos e (ou) bandas favoritos (as)
WL: U2, Dragonforce, Scorpions e Beatles

OR: Com que freqüência escuta música? Como (mp3, cd, rádio, etc.)?
WL: Costumo escutar no computador e no mp3 player.

OR: Como adquire as músicas? Compra? Em que formato (cd, mp3)?
WL: Na maioria em mp3, baixando discografias na internet
OR: Qual sua música preferida? Por que?
WL: With or without you do u2, uma música que é totalmente carregada de sentimento em suas notas, e pensar que ela quase foi descartada pela banda no álbum Joshua tree rsrs

OR: Qual sua opinião sobre a pirataria e o download ilegal pela Internet?
WL: Creio que é algo tão normal que deixará de ser considerado ilegal, pois virou costume entre a população.Culpa das gravadoras que tentam possuir um lucro absurdo, tornando o preço dos álbuns mais altos, e agora estão colhendo o que plantaram.

OR: Costuma ir a shows? Se sim, com que freqüência? Se não, por que?
WL: Vou a poucos shows, pois onde moro existe uma predominância do Forró quase que insuportável, tornando a vinda de artistas internacionais(minha preferência) algo raríssimo.

OR: Toca algum instrumento? Canta? Compõe? Exerce alguma atividade artística (pintura, desenho, etc.)?
WL: Apesar de meu pai ter toda uma aparelhagem para tocar violão de modo quase profissional, nunca tive a força de vontade de querer MESMO aprender a tocar.

OR: Estilo de música do qual não gosta. Por que?
WL: Forró, antro de artistas sem talento. Letras que mais parecem lavagem cerebral.

OR: Fones de ouvido ou som alto?
WL: Fones

OR: Dê uma dica musical (artista, música, etc.)
WL: Minha dica é, quanto a música, tente o máximo afastar uma coisa chamada preconceito.

OR: Pra mim, música é...
WL: Algo que as vezes parece um amigo que te da o ombro pra chorar ou aquela força que você precisa para continuar lutando a cada dia que passa.

Veja, no vídeo abaixo, o clipe da canção "With or Without You" da banda irlandesa U2, a canção preferida do Wesley:

domingo, 23 de maio de 2010

Prelúdios

Há quem associe a genialidade de Frédéric Chopin aos prelúdios, imaginando que o polonês tenha criado o gênero. Ele não foi o primeiro a compô-los, mas os reinventou em sua forma e execução. No fim do século 17, o termo “prelúdio” começou a ser empregado para obras introdutórias de composições como sinfonias, óperas e concertos. No século seguinte, com Bach, o gênero foi repensado, mas continuou a ser usado como abertura para outras peças: as fugas (composições feitas com duas ou mais vozes melódicas simultâneas) e as tocatas (obras eruditas criadas para instrumentos de teclas). O exemplo mais conhecido dessa época, que influenciou definitivamente Chopin, é O Cravo bem Temperado, de Bach, que reunia dois livros com 24 pares de prelúdios e fugas para um.

O que Chopin fez foi escrever prelúdios exclusivamente para piano. Portanto, com ele, na primeira metade do século 19, o gênero deixava de ser pensado como abertura para obras maiores e começava a ser concebido como pequenas peças isoladas e independentes. As 24 que formam os Prelúdios, opus 28 foram compostas por Chopin entre 1836 e 1839. Esse período engloba desde os tempos em que o pianista conheceu a escritora francesa George Sand até seu exílio com ela em Palma de Mallorca, para cuidar da saúde. Na costa litorânea espanhola, Chopin concluiu as composições e as vendeu para o fabricante de pianos Camille Pleyel por 2 mil francos.

Pequenas obras para o instrumento, com duração que varia de aproximadamente 45 segundos a pouco mais de cinco minutos, os Prelúdios, como definiu o compositor alemão Robert Schumann, eram “esboços, inícios de estudos... ruínas, pluma de águia...”. No aspecto técnico, eles soam como se fossem estudos para pianistas, uns parecem feitos para exercitar mais a mão esquerda, outros exigem mais da direita. Um exemplo a ser destacado é o Prelúdio número 16 em Si Bemol Menor, em que o autor apresenta todo o seu virtuosismo, exigindo que a melodia seja tocada de forma extremamente rápida.

Embora tenha vivido no período romântico, Chopin era muito mais um minimalista e dominador da técnica do que um sentimental exagerado. Mas os Prelúdios são essencialmente demonstrações sintéticas das angústias e incompletudes vitais do autor – as “ruínas” da alma a que Schumann se referia. Uma das peças que carregam essa melancolia é o Prelúdio Número 4 em Mi Menor, que quase 150 anos depois teria inspirado Tom Jobim a compor a canção Insensatez.

No fim da década de 1840, pouco antes de morrer, Chopin ainda compôs dois prelúdios (opus 45) bem diferentes dos anteriores. Assim como os Prelúdios, opus 28 e os Estudos, opus 10 e 25, essas obras influenciaram composições de seus contemporâneos, como os Estudos Sinfônicos, de Robert Schumann, e os Estudos Transcendentais, de Franz Liszt.

sábado, 22 de maio de 2010

Música erudita para o povo

Em 1791, seu derradeiro ano de vida, Mozart compôs simultaneamente suas duas últimas óperas, e elas não podiam ser mais diferentes entre si. A Clemência de Tito foi feita para a coroação de Leopoldo II como rei da Boêmia. Para estar à altura da ocasião, seguia as convenções do solene e heróico gênero do século 18 conhecido como opera seria. Já A Flauta Mágica não surgiu da encomenda de uma corte, mas sim de um projeto em comum com Emmanuel Schikaneder, diretor de um infame teatro no subúrbio vienense de Wieden, cuja platéia cheirava tanto a suor e cerveja que o pensador iluminista Johann Pezzl aconselhou que quem lá fosse levasse consigo cigarros.

Com uma ousadia que entrava em choque com o gosto clássico das cortes européias, A Flauta Mágica foi um sucesso estrondoso: naquele ano de 1791, a ópera foi levada mais de 50 vezes ao palco em menos de três meses.

O compositor italiano Antonio Salieri, injustamente apresentado como assassino de Mozart no filme Amadeus, “adorou não só a música como o libreto e tudo o mais”, escreveu o autor da Flauta Mágica em uma de suas últimas cartas. “Ouviu com a maior atenção da abertura até o final, e não houve um só trecho que não lhe arrancasse um bravo ou um bello!”.

Quando a ópera foi a Frankfurt, Catharina Elisabeth Textor, mãe do poeta Goethe, escreveu: “Nenhum homem admitiria que não assistiu. Todos os artesãos, jardineiros e até os camponeses, cujos filhos fazem os papéis de macacos e leões, vão lá assistir. Nunca houve um espetáculo assim aqui antes!”.

O que pode parecer vulgar foi, na verdade, uma das maiores revoluções na história da música. Pela primeira vez, a música erudita desceu do topo da hierarquia social e abandonou as amarras das convenções da corte ou do altar para tornar-se algo ao mesmo tempo sofisticado e popular, composto tanto para o príncipe quanto para seu criado.

Mesmo hoje, sua música parece ter esse apelo mais amplo. Em 1975, o cineasta Ingmar Bergman produziu uma encantadora filmagem da ópera, cantada em sueco. Na década de 1990, o contratenor pop Edson Cordeiro difundiu no Brasil a ária da Rainha da Noite, levando à televisão com seus agudos o espanto que a soprano Josefa Hofer deve ter causado na platéia rude do Theater auf der Wieden. Cordeiro chegou até a fazer um dueto sexualmente invertido em videoclipe com a roqueira Cássia Eller – ele com Mozart, ela com Rolling Stones. Está na capacidade de criar melodias simples, mas fortes, tal como as das canções folclóricas, uma das chaves desse sucesso.

Ambos maçons, Mozart e Schikaneder se conheceram quando o ator passou por Salzburgo com seu grupo teatral. A maçonaria, condenada desde 1738 por uma bula papal e proibida pela arquiduquesa austríaca Maria Theresa, nunca havia gerado uma peça significativa. A relação da Áustria com a organização sempre fora ambígua – católica, mas iluminista, fazia-lhe vistas grossas. No entanto, a repressão começara a aumentar em relação à Revolução Francesa, com a vigilância e o cerco patrocinados pelo imperador Leopoldo. Com o fechamento de lojas maçônicas, Schikaneder encontrou a oportunidade de explorar cenicamente os ritos proibidos, fazendo da Flauta Mágica uma apologia da sociedade secreta.

Ouça, no vídeo abaixo, a famosa ària da Rainha da Noite, trecho da ópera A Flauta Mágica:

sexta-feira, 21 de maio de 2010

A aventura de ser livre

Ninguém na música exerceu de modo mais pleno a liberdade do que Claude Debussy. Liberdade para buscar o novo e fugir do velho como o diabo da cruz. Uma liberdade, acima de tudo, guiada pelo prazer da escuta. É isso que torna sua obra uma das mais originais do século 20. Algo esperado para quem, ainda um jovem e desconhecido compositor, anunciava: “Não disponho de precedentes aos quais me remeter e me vejo obrigado a criar formas novas”.

A música do século 20 deve a Debussy a sua libertação das rígidas regras do passado. Foi ele que abriu as portas para novos e desconhecidos universos. A partir dele, elegeu-se o timbre como o parâmetro determinante da criação musical. O timbre é a marca sonora de cada instrumento. As exóticas escalas pentatônicas são diferentes, agradáveis, originais? Por que não utilizá-las? Os desenvolvimentos da forma-sonata são entediantes, chatos, previsíveis? Vamos renunciar a essa e a outras fórmulas calcificadas.

Claude Debussy foi um compositor único em sua época e na história da música. Nascido no início da segunda metade do século 19, tinha tudo para ser um seguidor do romantismo. Teve suas bases musicais fundamentadas nas obras de Liszt e Chopin. Mas, de forma natural, desde o princípio buscou uma linguagem própria. Teve a felicidade de viver em um dos momentos culturalmente mais efervescentes da França. Sua música encontrou ressonâncias nas pinturas de Monet, Degas e Renoir e na literatura de Baudelaire, Mallarmé e Paul Claudel. Sua música marcou toda uma geração de grandes compositores, como De Falla, Albéniz, Satie, Saint-Saëns, Kodaly, Respighi e Poulenc, entre outros. Ela foi tão forte e revolucionária que vemos sua influência no jazz do pianista estadunidense Bill Evans e no tango de Astor Piazzolla.

Debussy não aprovava rótulos como o de “impressionista” para sua música. Tal postura encontrou várias resistências, principalmente no começo de seus estudos. Ele viveu um período em que se lutava pelo rompimento da tonalidade, do academicismo, e se buscava uma música que não fosse analisável. Certa vez, seu mestre Guiraud disse, depois de ouvir um encadeamento de acordes ao piano: “É bonito, não nego, mas é teoricamente absurdo”. Debussy respondeu: “Não há teoria, basta ouvir. O prazer é a regra”.

Em uma época dominada pela obra monumental de Wagner, ele escolheu pequenas formas, como a Suite Bergamasque, na qual temos a genial Clair de Lune. Influenciado pelo simbolismo e por Mallarmé escreveu uma de suas obras mais famosas e revolucionárias, Prélude à L’Après Midi d’un Faune. Utiliza a música modal, assim como a escala de tons inteiros, preocupando-se com o colorido e com o timbre.

Além de um legado de composições como La Mer, Nocturnes e a ópera Pelléas et Mélisande, Debussy deixou inúmeros seguidores, que beberam em sua fonte, transformaram seus idéias e perpetuaram seu gênio.

Apresentado em público em 1894, o Prelúdio para o Entardecer de um Fauno é um dos primeiros marcos da música moderna. Inspirado em poema do seu compatriota Stéphane Mallarmé, Debussy desenvolveu uma obra que desafiou os paradigmas da forma erudita tradicional.

Nas palavras de Debussy, tratava-se de “ilustração muito livre de um poema” de Mallarmé, O Entardecer de um Fauno. A princípio, ele planejou uma obra de três partes; no entanto, só o prelúdio se concretizou. Esse universo de “situações sucessivas pelas quais se movem os desejos e sonhos de um fauno” pedia uma música de formas elásticas. A famosa introdução da flauta, por sua vez, brinca com a dubiedade tonal. Sinuosa, ela flutua para cima e para baixo entre notas adjacentes, deixando pairar por um tempo a dúvida: a música está em tom maior (de sonoridade mais alegre) ou menor (mais melancólica)? Some-se a isso uma orquestração luminosa, sem grandiosidade, que ressalta o som de cada instrumento, e a atmosfera de sonho estava criada.

Mallarmé não gostava que compositores musicassem seus poemas, mas aprovou o Prelúdio, dizendo que ele prolongava a emoção do poema. O público, de um modo geral, recebeu bem a obra. A crítica musical conservadora, no entanto, foi implacável. A languidez da obra foi criticada como falta de forma e de ritmo, e a “escrita anárquica” de Debussy foi duramente condenada. Chegou-se a dizer que suas harmonias eram “incorretas”, quando na verdade ele apostava na sutileza das antigas escalas gregas – de acordo com a influência pagã do simbolismo.

Mas os detratores denunciavam em Debussy, mais do que tudo, o “impressionismo”. O novo movimento das artes plásticas ainda era muito malvisto, e identificaram-se na música do jovem compositor influências do estilo. Para os críticos, aquela música “impura” era construída às pinceladas, sem precisão, privilegiando detalhes em vez do todo. Essa crítica seria, mais tarde, transformada em elogio.

Oficina entrevista: Thalyta Vasconcelos

Hoje, nossa entrevistada é Thalyta Vasconcelos, estudante de jornalismo e uma das mais recentes e promissoras modelos de Fortaleza :). E, não podemos nos esquecer, uma querida amiga e colega. Vamos às respostas da Thalyta:

OR: Como/Por que você começou a gostar de música?
TV: Comecei a gostar de música por que fiz ballet quando criança e jazz quando adolescente.

OR: Qual seu estilo musical favorito?
TV: MPB, POP e Jazz.

OR: Cantores (as), grupos e (ou) bandas favoritos (as)
TV: Chico Buarque; Elis Regina; Fagner; Maria Rita; Zeca Baleiro; Nando Reis; Vanessa da Mata...

OR: Com que freqüência escuta música? Como (mp3, cd, rádio, etc.)?
TV: Todo dia! No rádio e mp3.

OR: Como adquire as músicas? Compra? Em que formato (cd, mp3)?
TV: Compro ou pego na internet... Nos dois formatos.

OR: Qual sua música preferida? Por que?
TV: Escolher uma só é difícil... mas ultimamente escuto muito VOCÊ É MÁ – ZECA BALEIRO.

OR: Toca algum instrumento? Canta? Compõe? Exerce alguma atividade artística (pintura, desenho, etc.)?
TV: Não

OR: Estilo de música do qual não gosta. Por que?
TV: Hard Rock

OR: Fones de ouvido ou som alto?
TV: Som alto.

OR: Dê uma dica musical (artista, música, etc.)
TV: Fagner.

OR: Pra mim, música é...
TV: Estado de espírito, você se revela no que escuta.
Veja, no vídeo abaixo, Vanessa da Mata, uma das cantoras favoritas da Thalyta, cantando "Ainda bem":

quinta-feira, 20 de maio de 2010

A personificação da ópera

Ele foi o compositor italiano mais popular do século 19. Melhor: o compositor lírico mais popular de sua época. As árias mais famosas de suas 26 óperas não foram cantaroladas nas ruas e assobiadas apenas quando estrearam. Giuseppe Verdi conseguiu o milagre de ser intensamente popular em vida, e o tempo – outro milagre – jogou a seu favor. Suas óperas permanecem como o eixo fundamental das programações dos teatros de ópera em todo o mundo.

Não há como falar da obra de Verdi sem falar do homem que ele foi. Filho de um estalajadeiro e de uma fiandeira, sua educação se dá pelo som rude de rabecas e flautas tocadas por viajantes que se hospedavam nas humildes instalações de sua casa. Verdi não teve em sua infância uma formação de base, não teve de seu pai o apoio necessário, não teve de seus professores a instrução correta, mas algo suplantava tudo isso: o seu amor pela música.

Sério e dedicado, Verdi nunca deixou que as inúmeras dificuldades o afastassem do sonho de se tornar um músico reconhecido. Graças à proteção do comerciante Antonio Barezzi, iniciou seus estudos na escola de música de sua cidade natal. Foi recusado no exame que prestou para o Conservatório de Música de Milão, que hoje leva seu nome. Após o relativo êxito obtido com sua primeira ópera no Teatro alla Scala, em menos de um ano perde sua mulher e seus dois filhos, e sua segunda ópera fracassa. Nesse momento muito difícil, mais uma vez a música faz com que ele renasça. Graças a Nabucco e seu eterno coro Va, Pensiero, Verdi se torna um dos maiores nomes da ópera italiana. Seus sucessos se sucederam com força e constância jamais vistas na história da ópera. Passou, em seus mais de 50 anos como compositor, pelas mais diversas modas e movimentos. Viu a criação dos dramas líricos de Wagner, do Fausto, de Gounod, da Carmen, de Bizet, de Boris Godunov, de Mussorgsky, sem nunca perder o foco e desviar sua trajetória sob o efeito dessas novas idéias estéticas.

Quando resolveram adaptar a obra de William Shakespeare, em geral os compositores de ópera banalizaram e simplificaram as peças do dramaturgo inglês. Como Ambroise Thomas, que, em seu Hamlet providenciou um final feliz em que, em vez de morrer, o protagonista é coroado rei da Dinamarca. Nas mãos de Gioachino Rossini, a história de Otelo, o mouro de Veneza que as intrigas de Iago levam a matar, por ciúme, a mulher, Desdêmona, também não empolgou. Foi preciso que Verdi, auxiliado por um libretista de talento, pusesse as mãos na obra para que surgisse, finalmente, uma ópera que fizesse justiça à riqueza da dramaturgia shakespeariana.

Arrigo Boito, autor do libreto, tinha também veleidades de compositor, e sua ópera Mefistofele – baseada em Fausto, de Goethe – é ocasionalmente encenada nos grandes teatros de ópera do planeta. Ele condensou e respeitou as linhas gerais da intriga de Shakespeare, criando, ainda, um monólogo de grande efetividade – o Credo – para o vilão Iago. Considerada a mais trágica de todo o repertório de Verdi, é um tratado sobre o mal e o ciúme, admirável pela riqueza de detalhes na escrita orquestral e na busca por uma textura mais contínua. “Drama musical”, revolucionou a tradição operística italiana ao acabar com a separação rígida entre recitativos (texto) e ária (canto).

No libreto de Boito, a trama shakespeariana encontrou o casamento perfeito com uma música que ultrapassa as fronteiras do melodramático para aproximar-se das tragédias gregas. A orquestração eleva a temperatura dramática, assim como os monólogos do protagonista e a cena desesperançada da morte de Desdêmona no último ato. Estava aberto o caminho para as grandes óperas, mais tarde, de Giacomo Puccini.

Detalhista ao extremo com os libretos de suas óperas, Verdi estabeleceu seus tipos vocais básicos em Ernani. Os femininos eram mais flexíveis, enquanto os masculinos eram o barítono impetuoso e determinado, o tenor corajoso e, por vezes, desesperado e o baixo severo. O talento do compositor para as situações trágicas e heróicas encontrou espaço cativo na Itália do século 19, que, separada em reinos diferentes, lutava por unidade. Não à toa, na obra de Verdi os temas políticos são freqüentes – e ele próprio exerceria um mandato de deputado na Itália unificada.

Verdi regeu nos principais teatros da Itália, França, Áustria e Inglaterra. Inspirado em Shakespeare, fez, além de Otello, Macbeth e Falstaff. Nos anos 1870, pensou em abandonar a ópera, dedicando-se à composição de seu Réquiem, obra inspirada no poeta Manzoni. Em 1879, Arrigo Boito, com o editor Giulio Ricordi e o maestro Franco Faccio, incentivou Verdi, à beira dos 70 anos, a escrever uma nova ópera, Otello. A obra foi concluída apenas em 1886, fruto de trabalho lento e minucioso. Símbolo da Itália unificada (o Coro dos Escravos Hebreus, da ópera Nabucco, era cantado nas ruas como um hino italiano informal), Verdi morreu em Milão, rico e autoritário, no início de 1901. Mais de 28 mil pessoas acompanharam seu cortejo.

A obra de Giuseppe Verdi tem a nobreza e a simplicidade de seu caráter. Era um camponês humilde, sensível e entusiasta. Não criou nenhuma doutrina ou sistema. Acreditava que somente a sinceridade justificava a arte. E essa deve ser a busca de um intérprete de uma ópera de Verdi: transmitir ao público a verdade do drama, dos personagens e, conseqüentemente, de nós mesmos.

Certa vez perguntaram a Maria Callas, a diva das divas líricas, o que era a ópera. “Verdi”, ela respondeu. Então, vamos ouvir, no vídeo abaixo, um trecho de Otello:

quarta-feira, 19 de maio de 2010

O artista visionário

Richard Wagner teve uma iniciação muito mais teatral do que musical. Seus pais e suas irmãs eram atores. Sua primeira obra, escrita aos 9 anos, não foi uma ópera, e sim uma tragédia. Seus estudos de piano começaram somente três anos mais tarde, mas sua conexão com a música se estabeleceu de forma definitiva quando se mudou para Leipzig e conheceu a música de Beethoven por meio da Orquestra Gewandhaus.

Wagner era um homem de concepção artística abrangente. Suas idéias iam além da música. Sua concepção de um espetáculo completo, único e unificado, reflexo de sua própria postura egocêntrica, o levou ao que mais tarde ele mesmo chamaria de “drama musical” no lugar de ópera. Ele teve a ajuda de dois grandes compositores: Liszt, que mais tarde se tornaria seu sogro, e Meyerbeer, cujo apoio viabilizou a estréia da ópera Rienzi, em Dresden, Alemanha.

Outro apoio decisivo foi o de Ludwig II, rei da Baviera, que permitiu a Wagner realizar seus sonhos artísticos com a construção de um teatro na cidade de Bayreuth. A concepção arquitetônica dele era completamente diferente dos teatros da época. Não havia rebuscamentos e camarotes. Ele foi construído como um teatro grego de arena, em que todos os espectadores têm a visão completa de palco. A orquestra ficava escondida para que a atenção do público não fosse desviada da cena. Pela primeira vez, a luz da platéia foi apagada para dar maior foco ao drama.

Os sentimentos gerados pela paixão avassaladora por Mathilde Wesendonck, mulher de seu mecenas, e a leitura de Tristão e Isolda escrita por Gottfried de Strasbourg, datada de 1210, inspiraram Wagner a compor sua sétima ópera. O libreto, escrito pelo próprio compositor, é baseado em uma lenda celta que narra o romance entre Isolda, princesa da Irlanda, e Tristão, nobre da Bretanha.

As idéias de O Mundo como Vontade e Representação, obra do filósofo Arthur Schopenhauer, também foram decisivas para a composição da ópera – um paradigma do romantismo. Da leitura de Schopenhauer, Wagner extraiu um pessimismo quase místico, que casaria muito bem com o amor trágico e impossível de Tristão e Isolda. No plano real, sua paixão por Mathilde era considerada por ele tão impossível quanto a dos personagens da lenda. O próprio Wagner, em carta ao compositor Franz Liszt, afirma ter escolhido o tema como forma de sublimação de seu próprio destino amoroso, que, segundo ele, sempre foi sombrio.

Mesmo identificado com a lenda celta, Wagner abreviou o tempo de ação, eliminou personagens secundários, simplificou o enredo e alterou a história original em diversos pontos, tornando seu libreto absolutamente pessoal. No original, por exemplo, Tristão e Isolda se apaixonam após a ingestão de uma porção mágica: o amor entre eles é motivado quimicamente. Na ópera, Wagner já os apresenta apaixonados: o elixir serve apenas para reforçar e tornar consciente e irresistível um amor preexistente.

O arrebatamento de uma paixão e sua trágica impossibilidade – marcada pelo fato de Isolda estar prestes a se casar com o Rei Mark, tio de Tristão – permitiram a Wagner explorar recursos musicais que serviram de porta de entrada para o atonalismo, caracterizado por não obedecer a uma tonalidade preponderante, algo que foi desenvolvido no decorrer do século 20. A instabilidade e a flutuação permanente que essa técnica possibilita correspondem à tensão interna do drama narrado. A idéia inconclusa da paixão impossível e do questionamento existencial, portanto, reflete-se na obra, caracterizada por dissonâncias e por uma resolução que parece nunca se concretizar.

Quando Wagner iniciou a composição dos três atos de Tristão e Isolda, não imaginava que iria realizar algo tão inovador. De acordo com a biografia Wagner: Um Compêndio, de Barry Millington, o compositor interrompera O Anel de Nibelungo com o intuito de trabalhar em uma obra que fosse mais acessível e proporcionasse maior facilidade de encenação. Além dos fatores emocionais e subjetivos, Wagner levou em conta necessidades financeiras para escrever a ópera. O problema é que, ao criar algo tão complexo, Tristão e Isolda só ficaria pronta cinco anos após sua idealização e seria montada quatro anos depois de finalizada. A ópera finalmente estreou no dia 10 de junho de 1865, em Munique, sob regência do maestro Hans von Bülow.

Além da dissolução tonal, Wagner direciona-se na contramão do barroco e do classicismo, nos quais o bel canto, tradição vocal italiana que designa uma forma suave de interpretação, era privilegiado em detrimento da música. O objetivo do compositor era restabelecer o equilíbrio texto-música-espetáculo. Tristão e Isolda se consolidaria como o ponto máximo da obsessão de Wagner pela arte total: a busca por uma unidade orgânica, com o desenvolvimento de uma relação perfeita entre diferentes elementos, que culminaria em um amálgama transformado em drama lírico inigualável.

Assim era Wagner: uma pessoa completamente comprometida com sua arte.