quinta-feira, 29 de abril de 2010

Eu te amo... eu também não

Um amigo meu diz que Serge Gainsbourg é, pra França, o que Chico Buarque é pra nós, brasileiros. Fato. Artistas como Piaf, Trenet, Salvador e Brel são lendas, mitos da música francesa. Gainsbourg certamente está na lista.

Serge nasceu em Paris em 1928. Ele era filho de judeus russos que fugiram do país pra escapar da revolução de 1917. Seu pai era pianista, e se apresentava em clubes da capital francesa.

Gainsbourg estreou na vida artística em 1958, quando lançou seu primeiro disco de vinil. Em 1968 sua carreira já havia deslanchado: foi quando teve um affair com outro mito francês, a atriz Brigitte Bardot. Com ela, Serge gravou várias canções. Dentre elas o clássico “Je t’aime... moi non plus” – bastante sugestiva, por sinal. E por falar em sugestividade, essa é a cara das composições de Gainsbourg. Suas músicas são marcadas pelo duplo sentido, e pela forte insinuação sexual.

Gainsbourg compôs “Je t’aime...” pra Bardot, mas quem gravou a canção pela primeira vez foi a atriz inglesa Jane Birkin – que aparece em cenas de nudez do clássico “Blow up – depois daquele beijo”, de Michelangelo Antonioni. Gainsbourg casou-se, posteriormente, com Birkin, com quem teve Charlotte Gainsbourg, atriz que estrelou “Anticristo”, de Lars Von Trier.

Álcool, cigarros, escândalos e muitas mulheres foram os principais elementos da vida pública de Serge Gainsbourg. Ele colecionava polêmicas e amantes. Na música, seus maiores sucessos eram quase sempre gravados nas vozes de outras pessoas, como Françoise Hardy, Vanessa Paradis e Juliette Gréco.

A obra de Gainsbourg é muito diversa. Ele compunha de jazz a reggae, e ia do rock à música romântica. Sempre canções recheadas de duplo sentido, é claro. Muitas de suas músicas foram parar em trilhas sonoras de filmes, programas de TV, etc. O clássico “Je t’aime...” foi regravado inúmeras vezes. Teve versões feitas por Ray Conniff e Donna Summer.

Serge faleceu em 1991, por complicações cardíacas. Deixou uma obra vasta, e se tornou um mito da música da França.

Et voilà “Je t’aime... moi non plus”, que aqui no Brasil é a cara de “trilha sonora de motel” (como diz uma amiga minha) e programas de TV que falam sobre sexo:


Este post é dedicado ao colega Igor Lins, que gosta bastante do grande Serge :-)

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Hino do sertão brasileiro


Foi uma toada a marca mais profunda que o “rei do baião” deixou na música popular brasileira. Asa Branca é uma imagem, o retrato definitivo de uma realidade perene. De Luiz Gonzaga, o folclorista Luís da Câmara Cascudo dizia que era o cantor do Nordeste seco: “Paisagem pernambucana, águas, mato, caminhos, silêncios, gente viva e morta”. Entre suas canções sobre a seca e o sertão, Asa Branca é provavelmente a mais bem-acabada e, sem dúvida, a mais popular.

A asa-branca é uma pomba parda que, durante o vôo, revela uma faixa branca em suas asas. Diz a tradução nordestina que, quando ela abandona o sertão, é sinal de que a seca será dura. “Quando olhei a terra ardendo/ Qual fogueira de São João/ Eu perguntei a Deus do céu, uai/ Por que tamanha judiação” são os primeiros versos da composição. Asa Branca foi pioneira em trazer para as rádios a realidade do sertão. Em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, Gonzagão declarou que até havia sido chamado na época para prestar “esclarecimentos” sobre a letra aos funcionários da censura.

Precursora das músicas de protesto? Luiz Gonzaga dizia que sua composição era “um protesto”, “um protestozinho cristão, puramente nosso”. Asa Branca abordava um problema social que só viria a se agravar – o êxodo de milhares de sertanejos. Dizer que Luiz Gonzaga foi um ativista seria exagero. Compôs jingles para políticos identificados com a tradição latifundiária no Nordeste e até um em homenagem a Jânio Quadros na época em que ele se elegeu presidente.

Luiz Gonzaga revelou certa vez que Asa Branca não era uma criação original sua. Na verdade, melodia e letra teriam sido inspiradas em uma música tradicional que ouvia quando criança. Ele teria apenas aprimorado a harmonia e inserido partes da letra. Embora o registro de autoria da música possa ser questionado, não se pode negar a importância da gravação na disseminação da cultura de origem nordestina.

Em depoimento a Miguel Ângelo de Azevedo, Humberto Teixeira, parceiro em mais de 20 músicas com Gonzaga, contou que, durante as gravações, muita gente não gostou de Asa Branca. Acostumados com as músicas alegres e dançantes de Gonzaga, os músicos que participaram do registro chamaram-na de “moda de igreja”. Passaram até o pires no estúdio, com uma vela de novena, caçoando dos autores. Segundo Humberto, “mal sabiam eles que nós estávamos gravando ali uma das páginas mais maravilhosas da música brasileira”.

Em homenagem ao nosso “rei do baião”, Luiz Gonzaga, e aos nordestinos espalhados em todo o mundo, aqui vai Asa Branca, o hino do Nordeste brasileiro:

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Oficina entrevista: Tsvetelina Koleva

Mais uma de nossas entrevistas... desta vez, conversamos com Tsvetelina Koleva. Ela tem 18 anos e é estudante. Tsvetelina nasceu em Sofia, capital da Bulgária. Vamos saber um pouco mais sobre o que ela gosta de ouvir:

OR: Como/Por que você começou a gostar de música?
TK: Porque a música me dá a impressão de um mundo totalmente diferente que, na realidade, é a expressão de minha própria imaginação

OR: Qual seu estilo musical favorito?
TK: Rock, tetr, alternativo

OR: Cantores (as), grupos e (ou) bandas favoritos (as)
TK: Linkin Park, Kings of Leon, Guano Apes, Lacuna Coil, Bon Jovi, Pink Floyd...

OR: Com que freqüência escuta música? Como (mp3, cd, rádio, etc.)?
TK: Mp3 et rádio

OR: Como adquire as músicas? Compra? Em que formato (cd, mp3)?
TK: De tempos em tempos para dar de presente, em formato de cd

OR: Qual sua música preferida? Por que?
TK: “Pushing me away” – Linkin Park, porque foi a primeira canção que escutei e porque ela reflete meus sentimentos

OR: Qual sua opinião sobre a pirataria e o download ilegal pela Internet?
TK: É realmente a fonte mais utilizada hoje em dia, mas eu penso que é preciso haver medidas mais restritas para assegurar a proteção dos artistas musicais

OR: Costuma ir a shows? Se sim, com que freqüência? Se não, por que?
TK: Sim, quando o grupo está entre meus preferidos

OR: Toca algum instrumento? Canta? Compõe? Exerce alguma atividade artística (pintura, desenho, etc.)?
TK: Pratiquei 2 anos de piano, mas parei

OR: Estilo de música do qual não gosta. Por que?
TK: Techno – porque a maioria das canções é idêntica

OR: Fones de ouvido ou som alto?
TK: Som alto

OR: Dê uma dica musical (artista, música, etc.)
TK: Kings of Leon – Closer

OR: Pra mim, música é...
TK: Um outro mundo que amo muito

Veja o vídeo de "Pushing me away", música preferida de Tsvetelina. Ela é mesmo fã de Linkin Park (vide a foto) :-)


Oficina entrevista: Lia Costa

Continuando nosso ciclo de entrevistas...
Lia da Costa é portuguesa, tem 25 anos e estuda na França. Lá, ela participa com frequência de festas dedicadas à cultura brasileira. A seguir, a entrevista que fizemos com ela:

OR: Como/Por que você começou a gostar de música?
LC: Porque nasci nesse meio, e a musica é a minha forma de liberdade

OR: Qual seu estilo musical favorito?
LC: Gosto de coisas muito diferentes, mas se tiver que escolher diria musica r’n’b

OR: Cantores (as), grupos e (ou) bandas favoritos (as)
LC: Vários, não posso enumerar

OR: Com que freqüência escuta música? Como (mp3, cd, rádio, etc.)?
LC: Todos os dias, no trabalho e em casa por cd

OR: Como adquire as músicas? Compra? Em que formato (cd, mp3)?
LC: Compro cd's, e às vezes faço compilações no mp3

OR: Qual sua música preferida? Por que?
LC: “Nha Vida” da Lura é uma música que me faz lembrar muitas coisas

OR: Qual sua opinião sobre a pirataria e o download ilegal pela Internet?
LC: Bem, acho que é hoje em dia uma coisa banal, mas que prejudica muitos artistas. Acho que deveria ser mais moderado o acesso ao dowload

OR: Costuma ir a shows? Se sim, com que freqüência? Se não, por que?
LC: Não vou muito pois às vezes é caro e outras vezes é longe

OR: Toca algum instrumento? Canta? Compõe? Exerce alguma atividade artística (pintura, desenho, etc.)?
LC: Faço percussão, toco surdo, congas, caixa, repinique...

OR: Estilo de música do qual não gosta. Por que?
LC: Tudo o que é muito barulhento, como hard metal, pois não me reconheço nesse estilo

OR: Fones de ouvido ou som alto?
LC: Som alto!!!

OR: Dê uma dica musical (artista, música, etc.)
LC: Lura e Mayra Andrade, são jovens que realmente transmitem a cultura cabo-verdiana...

OR: Pra mim, música é...
LC: Liberdade de expressão, alternativa a muitas coisas más e um meio de comunicação

Veja o clipe de "Nha vida", de Lura, música favorita da Lia. A artista canta em crioulo de Cabo Verde:

O regente compositor


Gustav Mahler é o Beethoven do século 20. Suas monumentais nove sinfonias constituem um Himalaia musical a ser conquistado por maestros e orquestras sinfônicas do planeta. Músicos põem seu talento à prova ao interpretá-las. E o público encontra nas obras do compositor o que ele almejava ao escrevê-las: “Uma sinfonia deve ser como o mundo. Abranger tudo”. Mahler ocupou um lugar que durante um século e meio, até os anos 1950, foi cativo de um gênio: Beethoven e suas nove sinfonias.

Mas, diferentemente do autor de Sonata ao Luar, que desfrutou de imenso prestígio em vida, Mahler foi um ser humano atormentado. Era uma celebridade internacional, não por causa de sua música, mas, como um maestro talentosíssimo. Tinha fama de “compositor de verão”. Só compunha durante as férias de verão do Hemisfério Norte, entre julho e setembro, no intervalo de suas atribuições como maestro da Ópera e da Filarmônica de Viena. “Sei muito bem que como compositor não terei reconhecimento em vida. Espero esse reconhecimento para mais tarde, quando já estiver morto. É a distância necessária para uma adequada avaliação de um fenômeno como eu”, disse, resignado.

Se atualmente Mahler é respeitado como um dos maiores compositores do final do século 19 e início do 20, ele era visto por seus contemporâneos como um dos mais importantes regentes da história. Com Mahler, a regência adquire uma importância extraordinária. Eram famosos seus duros e longos ensaios. E sua busca pela perfeição interpretativa abriu as portas para a regência no século 20. Tivemos grandes compositores-regentes antes de Mahler, como Mendelssohn, Wagner, Berlioz e Tchaikovsky. Mas nenhum desempenhou ambas as atividades com a mesma qualidade e dedicação. Sem dúvida, a carreira como regente foi fundamental para o sucesso de sua carreira como compositor.

Mahler foi excepcional orquestrador. Usava combinações de instrumentos e timbres ainda não experimentados, obtendo resultados criativos e originais. Suas obras sinfônicas são, na maioria, grandiosas, fazendo uso de um extraordinário número de músicos. Mesmo com toda essa opulência, a sua música era profunda, sombria e, por que não? , funesta. Sua obra nos coloca em contato com o divino, sem nos fazer esquecer de que somos humanos. Ela nos leva a uma jornada de nascimento, crescimento, sofrimento, redenção e elevação. Sua obra é, portanto, uma experiência de vida!

A composição do austríaco que vamos ouvir a seguir, não é a minha favorita, mas é uma belíssima obra também e que vale ser ouvida porque a Sinfonia número 5, inaugura a chamada fase “vienense” de Gustav Mahler. Na época em que foi escrita, o compositor e regente havia restaurado o brilho da Ópera de Viena. Sua linguagem musical também se renovou: em favor da abstração, o programa passou a pesar menos em suas sinfonias. Deixou de lado movimentos com partes vocais e reforçou a coesão estrutural, dando mais harmonia ao conjunto da obra.

A sinfonia foi dividida por Mahler em três partes: a primeira e a última com dois movimentos cada uma, mais um outro entres elas. As primeiras notas do trompete lembram a Marcha Nupcial do alemão Felix Mendelssohn, mas logo a melodia mostra-se triste: é uma marcha fúnebre. Mais adiante, as cordas do registro agudo e os tímpanos reforçam a carga dramática do primeiro movimento. O segundo, agitado, é uma fantasia sobra a marcha e progressivamente diminui a tristeza. O terceiro movimento traz mudanças grandes de dinâmica e foi muito incompreendido na época. Mahler expressou receio de que os regentes da época o interpretassem rápido demais, julgando-o “absurdo”, e desejou que a sinfonia tivesse a primeira audição 50 anos após a sua morte.

O trecho mais conhecido da sinfonia é o adagietto. O movimento ganhou ainda mais projeção como trilha do filme Morte em Veneza, do diretor italiano Luchino Visconti. Sua delicadeza surpreende: a execução fica a cargo das cordas e da harpa apenas. A Sinfonia número 5 termina em clima de marcha alegre e cita ironicamente uma canção que fala de um concurso de canto entre pássaros julgado por um burro. Os “burros” seriam os críticos, que certamente não compreenderiam a composição. O finale grandioso, que retoma o tema final do segundo movimento, é o mais bem-sucedido de Mahler. No entanto, paira a dúvida lançada pelo filósofo alemão Theodor Adorno: seria esse encerramento uma demonstração da habilidade criativa ou uma paródia das formas clássicas, que restringiriam a inventividade?


domingo, 25 de abril de 2010

Monteverdi, revolucionário do drama musical


Na mitologia grega, Orfeu é um músico que, com sua lira, consegue domar os guardiães do reino dos mortos para resgatar sua amada, Eurídice. Nada mais sintomático, assim, que a grande ópera da história tenha o personagem como protagonista. Orfeu, do italiano Claudio Monteverdi, não foi exatamente a primeira ópera escrita – a honra cabe a Dafne, hoje perdida, do também italiano Jacopo Peri, autor ainda de uma Eurídice, normalmente tida como a mais antiga ópera cuja partitura se conservou. Como muitas do período, ela reflete as especulações intelectuais do grupo de pensadores conhecido como Camerata Florentina, que buscavam recriar a unidade entre música e poesia que imaginavam existir no teatro grego antigo. Por isso, não passa hoje de curiosidade musicológica.

Até a criação da Camerata, predominava a música polifônica, em que diversas linhas melódicas se sobrepõem. Peri, Giulio Caccini e outros autores italianos do período (como Vincenzo Galilei, pai do astrônomo Galileu Galilei) começaram as primeiras experiências de monodia – ou seja, uma escrita que tivesse uma linha melódica principal, com acompanhamento. Esses experimentos com a monodia conduziram à invenção do recitativo, um estilo de escrita para voz que procura seguir os ritmos, acentuações e contornos naturais da fala. A música deveria servir para sublinhar e enfatizar as intenções do texto.

No livro O Diálogo Musical, o maestro Nikolaus Harnoncourt explica que em Orfeu, como nas outras óperas daquela época, a poesia ocupava o primeiro plano. Só que a música também foi empregada em modo pleno, com toda a sua riqueza formal – e aí está o segredo para a criação de Monteverdi, estreada em 1607, continuar sendo encenada com regularidade em teatros de todo o planeta até hoje.

Orfeu tem uma linguagem musical eclética, mesclando elementos do novo estilo monódico barroco (a seconda prattica) e do antigo estilo polifônico renascentista (a prima prattica), como os madrigais (obras vocais sobre textos seculares, normalmente a cinco vozes) e as danças. E mais: além de combinar a música do passado e a do presente, a ópera apontava para o futuro. Conforme explica Harnoncourt em seu livro, em Orfeu “já se encontram anunciadas ou pressentidas inúmeras técnicas que surgiram na ópera durante os séculos seguintes”, como a ária, a canção estrófica, o motivo condutor (ou leitmotiv) e uma instrumentação inspirada pelo drama.

Pois é em Orfeu que aparece a primeira orquestra autêntica, com 40 instrumentos para acompanhar o canto e caracterizar musicalmente os personagens e cenários onde a ação se desenrola. Com libreto de Alessandro Striggio, Monteverdi separa os dois mundos presentes na ópera – o dos pastores, sol e alegria, e o dos infernos sombrios – pelos andamentos e timbres.

Duas edições de Orfeu foram impressas com a autorização de Claudio Monteverdi – em 1609 e 1615 – e dedicadas ao príncipe Francesco Gonzaga, para cujo pai o compositor trabalhava em Mântua, em uma corte que também empregava os serviços do pintor flamengo Peter Paul Rubens. O fato demonstra o grande sucesso da ópera, cuja duração é de uma hora e meia – os madrigais da ópera duravam, no máximo, cinco minutos. Das 15 óperas escritas por Monteverdi, restaram apenas três: Orfeu, O Retorno de Ulisses à Pátria e A Coroação de Popéia, mais um fragmento de Arianna. As demais se perderam.

Ouça, no vídeo abaixo, um trecho da ópera Orfeu:

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Oficina entrevista: Danilo Limas

Na segunda série de entrevistas para a Oficina da Radiola, nós trazemos hoje as preferências musicais de Danilo Limas, estudante do curso de Publicidade na Unifor. Danilo, por ser um apaixonado por música, sempre procura descobrir novas bandas pela internet. Então, aqui vai a entrevista com o Darilho:

OR: Como/Por que você começou a gostar de música?
DL: Desde pequeno

OR: Qual seu estilo musical favorito?
DL: Country, rock e blues

OR: Cantores (as), grupos e (ou) bandas favoritos (as)
DL: Kings of Leon, Arctic Monkeys, The Black Keys

OR: Com que freqüência escuta música? Como (mp3, cd, rádio, etc.)?
DL: Todo dia

OR: Como adquire as músicas? Compra? Em que formato (cd, mp3)?
DL: Na internet (mp3)

OR: Qual sua música preferida? Por que?
DL: Holy Roller Novocaine (Kings of Leon). Gosto da letra, da história, do ritmo...

OR: Qual sua opinião sobre a pirataria e o download ilegal pela Internet?
DL: Os preços dos CDs são caros. Por isso, o download é a opção mais viável.

OR: Costuma ir a shows? Se sim, com que freqüência? Se não, por que?
DL: Não. Em Fortaleza não tem muitos shows legais. Quando tem, vou. Pretendo ir no Woodstock em outubro.

OR: Toca algum instrumento? Canta? Compõe? Exerce alguma atividade artística (pintura, desenho, etc.)?
DL: Desenho

OR: Estilo de música do qual não gosta. Por que?
DL: Swingueira. A letra e o ritmo são ruins.

OR: Fones de ouvido ou som alto?
DL: Fone de ouvido com volume alto.

OR:Dê uma dica musical (artista, música, etc.)
DL:The Black Keys

OR:Pra mim, música é...
DL: FUNDAMENTAL

Veja o clip de "Tighten Up", música que faz parte do mais recente trabalho da banda The Black Keys, a dica musical do Darilho:

Entr'acte: simplicidade e irreverência

A obra de Erik Satie manteve-se inclassificável e em constante mutação ao longo das décadas. Apesar de ter influenciado músicos franceses das várias correntes musicais modernistas de sua época, o excêntrico compositor ficou à parte de todas elas. O estilo de Satie alcançou o ponto máximo de clareza e despojamento em Entr'acte, sua última criação.

Em 1924, as vanguardas mediam forças em Paris. O pintor e poeta Francis Picabia, depois de ter abandonado o dadaísmo, queria provocar os surrealistas. Ciente da irreverência de Erik Satie, convidou-o para compor a trilha para o balé Relâche. A ironia começava pelo título: "relâche" era o aviso colocado na porta dos cinemas quando as sessões eram suspensas. Os Ballets Suédois apresentariam a coreografia em dois atos; no intervalo, seria exibido o filme Entreato Cinematográfico, de René Clair, também com a música de Satie. Eram obras dadaístas em sua essência, mas desvinculadas do movimento.

A estréia foi tumultuada - como seu idealizador desejava. O cenário trazia inscrições provocativas como "Se você não gostar disso, o caixa lhe venderá um apito por dois centavos". No filme de René Clair, Satie e Picabia faziam figuração brincando com um canhão apontado para os espectadores. Como não havia sonorização na época, a trilha do filme foi executada ao vivo. Sua simplicidade era extrema: uma sucessão de trechos repetitivos, quase mecânicos, juntados sem nenhuma cadência. Apenas um tema principal retornava ocasionalmente: ainda assim, a melodia era totalmente secundária em relação ao ritmo e à harmonia. A ironia de Satie aparecia em trechos como o do funeral em câmera lenta: nada mais apropriado que uma paródia da Marcha Fúnebre do polonês Frédéric Chopin. Sua escrita para piano, muito rítmica, revelava a influência da música de dance-hall e da vida urbana moderna.

No entanto, nem sempre o estilo de Satie havia sido assim. Em Gymnopédies, um de seus primeiros trabalhos, a melodia espalhava-se vagarosamente sobre acordes alterados - uma influência decisiva para o conterrâneo Claude Debussy. Até a década de 1910, ambos mantiveram muito contato, embora apenas Debussy tivesse alcançado a fama. Nessa época, o também francês Maurice Ravel resgatou as obras iniciais de Satie nos recitais da Sociedade Musical Independente, tornando-o mais conhecido.

A notoriedade viria com o balé Parade, em 1917. Para o espetáculo do artista Jean Cocteau, com cenário do espanhol Pablo Picasso e coreografia do russo Léonide Massine, criou uma trilha ruidosa e fragmentada. O escândalo foi comparável ao da apresentação de A Sagração da Primavera, de Igor Stravinsky, três anos antes. Nessa época, Satie se tornou um crítico dos seguidores de Debussy. Juntou-se a uma nova geração de compositores que viria a ser conhecida como "Os Seis". Com um deles, Darius Milhaud, criou em 1920 o gênero "música de mobiliário", que não se prestava para ser apreciada, mas estar presente como fundo musical.
Veja, no vídeo abaixo, um trecho do filme Entr'acte e a trilha de Erik Satie:

quarta-feira, 21 de abril de 2010

A batida do destino à porta

Pergunte quem não tenha familiaridade com a música erudita e peça que “cante” uma composição de Beethoven. Muito provavelmente, a resposta será o “tan-tan-tan-taan” – talvez o tema rítmico mais marcante da história musical, tão forte que se tornou a letra “V” (de vitória) no código Morse. Essas quatro figuras rítmicas que permeiam toda a composição – que apareceriam em mais tantas, como a Sonata Appassionata, o Concerto para Violino opus 131 e o Concerto para Piano número 4 – abriram a música de Beethoven para além do mundo germânico.

Apesar de muitos a apresentarem como antecipação triunfal do romantismo ou como obra que derrubou a regularidade do classicismo, a Quinta Sinfonia de Beethoven não abre mão, do começo ao fim, das leis de estrutura musical consagradas por Joseph Haydn. Estruturalmente, é uma obra mais clássica que a sinfonia Eroica. A novidade não está na desobediência às regras, mas sim na forma direta e incandescentemente enérgica como as idéias musicais são apresentadas e reforçadas: as três notas curtas que se encadeiam em uma outra longa são repetidas consecutivamente durante os 58 primeiros compassos, sem modulações. Nas palavras de Beethoven, “so pocht das Schicksal na die Pforte” (assim bate o destino à porta).

Um possível caráter militar não deixou de ter implicações patrióticas entre seus contemporâneos. A Quinta foi concluída por ocasião do surgimento do patriotismo alemão, estimulado pelo Tratado de Tilsit, em 1807, quando a Prússia entrou em colapso e cedeu à França seu território entre os rios Reno e Elba. No entanto, biógrafos tendem a atribuir o vigor da composição menos a um triunfalismo marcial do que à intimidade de Beethoven. Segundo o compositor francês Hector Berlioz, Beethoven revelou na Quinta “suas ansiedades mais privadas, suas meditações mais solitárias e desoladas, visões noturnas (...), com ardor de seu mais novo amor [especula-se que o tal destino era o impedimento de que se unisse a Theresa Brunswick, possivelmente a tal Amada Imortal”.

A exploração de pausas torna a peça ainda mais expressiva. “Minhas pausas têm que ser longas e sérias. Você acha que as fiz (...) por saber o que escrever? (...) O sangue vital da nota tem que ser espremido até a última gota, com força para levar as ondas do mar e deixar à mostra o fundo do oceano, parar o caminho das nuvens, dispersar as névoas e revelar o límpido céu azul e a face incandescente do sol.”

Com tamanho apelo, a obra não demorou a ser incorporada pela cultura pop. Walter Murphy criou uma versão disco que entraria na trilha sonora de Embalos se Sábado à Noite; nos anos 1980, o virtuose da guitarra Yngwie Malmsteen fez uma versão metal, enquanto, na década seguinte, ela inauguraria a sala de concertos de Springfield, a cidade dos Simpsons.

A Sinfonia número 5 de Beethoven, é uma das músicas favoritas da minha companheira de blog e amiga, Elis Campos. Então, em homenagem à Elis, este texto foi escrito e esta composição pode ser ouvida e vista no vídeo abaixo:



Confira um podcast que fizemos a partir da seguinte pergunta: "Quando você escuta falar de Beethoven, do que você lembra?" no link

E ouça uma rápida entrevista que fizemos com o maestro Márcio Landi, da Orquestra Eleazar de Carvalho, sobre Beethoven no link

terça-feira, 20 de abril de 2010

Oficina entrevista: Marie-Carlotte Diop

O Oficina da Radiola decidiu fazer uma série de entrevistas com vários amantes da música espalhados por aí. No blog, publicaremos um questionário único e as mais diversas respostas que recebemos de nossos entrevistados.

Pra começar, falamos com Marie-Charlotte Diop, que nasceu em Dakar, no Senegal. Ela tem 23 anos e é estudante.

OR: Como/Por que você começou a gostar de música?
MC: Desde a adolescência

OR: Qual seu estilo musical favorito?
MC: Tudo! Pop, rock, indie, hip hop, world music, alternativo...

OR: Cantores, grupos e/ou bandas favoritas
MC: Não artistas específicos; Yousou Ndour, Tori Amos, Sia, Ludacris, Linkin Park...

OR: Com que frequência escuta música? Como (mp3, cd, rádio, etc.)?
MC: O tempo todo! 10 horas por dia através do computador e da tv.

OR: Como adquire as músicas? Em que formato (cd, mp3)?
MC: mp3, no Spotify

OR: Qual sua música preferida? Por que?
MC: São muitas! Mais de cem. Por exemplo: "Welcome to heartbreak", Kanye West...

OR: Qual sua opinião sobre a pirataria e o download ilegal pela internet?
MC: É muito útil quando não se tem dinheiro para comprar legalmente.

OR: Costuma ir a shows? Se sim, com que frequência? Se não, por que?
MC: Quase nunca, por falta de tempo.

OR: Toca algum instrumento? Canta? Compõe? Exerce alguma atividade artística (pintura, desenho, etc.)?
MC: Piano.

OR: Estilo de música do qual não gosta. Por que?
MC: Rap hardcore.

OR: Fones de ouvido ou som alto?
MC: Fones de ouvido em volume bem alto.

OR: Eu recomendo... (artista, música, etc.)
MC: Miss Platnum, Richard Bona, Mayra Andrade.

OR: Pra mim, música é...
MC: ...a vida, não posso viver sem música.

Veja o clip de "Welcome to heartbreak", de Kanye West, uma das músicas favoritas da Marie-Charlotte:


segunda-feira, 19 de abril de 2010

A riqueza da música popular do leste europeu

Nenhum compositor fez uma síntese tão perfeita de elementos populares nacionais e códigos musicais eruditos quanto o húngaro Béla Bartók. Concerto para Orquestra, obra da maturidade, é seu exemplo mais notável. No início da carreira, Bartók era mais reconhecido como pianista do que como compositor. Dois acontecimentos mudariam seu rumo em 1905: uma viagem a Paris, que lhe revelou os encantos do cosmopolitismo, e a amizade com o compositor húngaro Zoltán Kodály, que o aproximaria da música camponesa de seu país.

Com Kodály, que também era linguista, Bartók percorreu diversos volarejos na Hungria, registrando músicas tradicionais em cilindros de cera. Milhares de composições populares húngaras e também romenas, eslovacas, búlgaras, turcas e até norte-africanas foram gravadas e depois transcritas pela dupla. Em vez de usar superficialmente temas para gerar um colorido folclórico, Bartók incorporou características básicas do processo de composição popular, com base nas quais ele desenvolvia técnicas eruditas modernas. É o caso do segundo e do quarto movimentos do Concerto para Orquestra, que revelam grande influência rítmico-melódica do Leste Europeu.

O gênero concerto apresenta um ou dois solistas acompanhados por uma orquestra. Nessa composição de Bartók, todos os músicos se alternam no papel de solista. A habilidade da orquestra é exigida em trechos com grande intercalação de temas e mudanças bruscas de andamento e humor, como no quinto movimento. O divertido segundo movimento, Giuoco delle Coppie (Jogo das duplas), valoriza os sopros, que desenvolvem a melodia sempre aos pares, com muita leveza.

A obra foi composta durante o sofrido exílio de Bartók nos Estados Unidos, durante a Segunda Guerra. A Hungria havia se alinhado com a Alemanha nazista, mas o compositor hesitou muito antes de partir, já que a viagem implicaria um distanciamento das aldeias que visitava. Depois de ter trabalhado para a Universidade Columbia com gravações servo-croatas, o músico entrou numa fase difícil. Estava com pouco dinheiro, desenvolveu uma leucemia tardiamente diagnosticada e era pouco conhecido do público estadunidense. Graças ao contato de amigos, o maestro russo Sergei Koussevitzky encomendou a ele um concerto para a Orquestra Sinfônica de Boston. O resultado transformou Bartók no mais popular compositor do século 20 nos Estados Unidos - ainda que após sua morte.

Mesmo doente, Béla Bartók foi à estréia do Concerto para Orquestra, em dezembro de 1944. Koussevitzky declarou ao compositor que aquela era a melhor obra dos últimos 20 anos - depois da apresentação, "corrigiu" para 25. Bartók brincou com o maestro, perguntando se isso incluía as sinfonias de seu ídolo e compatriota Dmitri Shostakovich, a quem o compositor húngaro dava pouco valor. A piada tinha razão de ser: um trecho do Concerto parodia a Sonfonia número 7 de Shostakovich.

Confiram no vídeo abaixo, Concerto para Orquestra, do grande, talentoso e surpreendente Béla Bartók:

domingo, 18 de abril de 2010

Continue sorrindo, apesar de tudo


Tempos Modernos tornou-se um dos filmes mais conhecidos de Charles Chaplin muito por causa das cenas da primeira parte da história, nas quais o personagem Carlitos aparece como empregado de uma linha de montagem que acaba sendo engolido pela máquina. O trabalho de apertar parafusos é tão repetitivo que produz no protagonista comportamentos obsessivos mesmo fora do ambiente da fábrica. Amalucado, ele passa a apertar qualquer botão que encontra pela frente, como os que vê no vestido de uma senhora que cruza a rua. A crítica à forma mecânica da exploração do trabalho em linhas de produção é evidente, mas não é a única que o filme faz.

Na rua, Carlitos vê um passar um caminhão, de onde cai uma bandeira, possivelmente vermelha (o filme é em preto-e-branco). Ele a pega para devolver e logo aparece, atrás dele, uma manifestação de trabalhadores. O personagem é então preso e acusado de ser comunista. Por esta e outras o filme, supostamente de conteúdo socialista, foi proibida da Alemanha de Hitler e na Itália de Mussolini. Nos Estados Unidos, Chaplin também enfrentrou dificuldades para exibi-lo, devido às críticas que faz ao capitalismo e à desigualdade social.

Nos anos 1950, durante a chamada “caça às bruxas”, em que o senador Joseph McCarthy liderou um processo de julgamento de pessoas públicas sob a acusação de atividades anti-americanas (leia-se “comunismo”), este foi um dos filmes que levaram Chaplin a ser perseguido politicamente, o que culminou com seu exílio na Suíca.

Mesmo após o advento do som no cinema (a partir de 1927), Chaplin insistiu em fazer filmes sem falas, como neste caso. Apesar de mudo, Tempos Modernos utiliza o som de um modo chapliniano e burlesco, quando aparecem em cena aparelhos mecânicos de reprodução sonora, como videofones, fonógrafos e rádios, para reiterar o tema do filme sobre a tecnologia e a desumanização.

Contudo, vale ressaltar que Chaplin explorava as possibilidades estéticas do som compondo ele mesmo as trilhas de seus filmes, o que deu origem a um punhado de canções que entraram para a história, entre os quais Smile, tema da cena final de Tempos Modernos que você pode escutar no vídeo abaixo:



sábado, 17 de abril de 2010

Tango revolution

Assim como a identidade musical brasileira está intimamente ligada ao choro, ao samba e sobretudo à bossa nova, a Argentina é a cara do tango (ou vice-versa). Pra mim (e muita gente há de concordar comigo:-]), esse é um dos estilos mais charmosos, sedutores e elegantes do universo musical.

Sem discutir o mérito da criação do tango (uruguaios e argentinos ainda não se entenderam muito bem sobre isso), o fato é que Buenos Aires ficou conhecida como a capital mundial do estilo. Lá, floresceram os trabalhos de “tangueros” geniais, como Carlos Gardel (já comentado aqui no blog) e Astor Piazzolla, que muita gente não considera um compositor de “tango de raiz”. Isso porque, nas décadas de 60 e 70, Piazzolla fazia música portenha temperada com jazz e música clássica. Uma revolução. Ao receber críticas de ortodoxos defensores do tango tradicional, o compositor de “Adiós Nonino” e “Libertango” (que eu particularmente amo) dizia que fazia “música contemporânea de Buenos Aires”.

Sem dúvida, as inovações propostas por Piazzolla influenciaram o surgimento de uma nova corrente do tango – o “tango eletrônico”, ou “tecnotango”, ou “neotango”, ou ainda “tango fusion” -, que surgiu no final da década de 90. O tango eletrônico propõe a fusão de estilos aparentemente opostos – o tango clássico e a música eletrônica; uma mistura entre dramático e sintético.

A matéria-prima do tango eletrônico é a união entre elementos tradicionais, como o bandoneón (o acordeon do tango), e novas técnicas de mixagem por computador e samplers (equipamentos de armazenagem de sons). As músicas podem ser temas em remix, composições inéditas ou criações feitas a partir de fragmentos de tangos já existentes. Dentre os grupos precursores do neotango, estão o Gotan Project, Tanghetto e Bajofondo.

Trago pra vocês a canção “Pa’ bailar”, que faz parte do álbum Mardulce, do grupo Bajofondo:



Assista também ao belo clip de "Milonga de amor", do Gotan Project.

E veja "Libertango", de Piazzolla, interpretado por Yo-Yo Ma.

Um músico completo

É difícil imaginar como um jovem de 17 anos pode escrever uma música tão perfeita como Sonhos de uma Noite de Verão, que, inspirada na peça de William Shakespeare, é uma das obras mais belas do repertório erudito e cujas características predominantes são a jovialidade, a alegria e o senso de humor, revestidos de uma elegância incomparável.

O alemão Félix Mendelssohn foi um prodígio como Mozart. Aos 9 anos, já compunha e tocava piano excepcionalmente bem. Neto de filósofo, nasceu no seio de uma importante família judia de Hamburgo, na Alemanha. E cresceu em um ambiente intelectual efervescente, em contato com grandes nomes da época, como Humboldt e Goethe. Esse último ficou impressionado com a maturidade demonstrada por um músico tão jovem. Era calmo, alegre e muito educado. O pai, mesmo sabendo do talento do filho, nunca o expôs ao público. Não o incentivou a seguir a carreira musical até que ele próprio desejasse.

Logo depois da morte do compositor, Richard Wagner o atacou no livro O Judaísmo na Música. O pecado de Mendelssohn: ser judeu. A estocada de Friedrich Nietzsche foi mais sutil. O filósofo o definiu como um “belo incidente” situado entre Beethoven e Brahms. Essa interpretação, repetida à exaustão por críticos como George Bernard Shaw nas décadas finais do século 19, cristalizou a imagem de Mendelssohn como apenas um bom compositor.

Apesar de não ser fluente em inglês, Mendelssohn era fascinado pelos contos de duendes, fadas, elfos e reinos abordados na comédia de Shakespeare. O tom fantástico inspirou, com espontaneidade quase infantil, a construção de uma música que impressiona pela expressividade. A obra serviria no futuro como exemplo para tratados sobre orquestração. A escrita ágil, as sugestões sonoras e o colorido romântico da abertura passam com perfeição a idéia e o clima do texto original.

Os compassos que antecedem o trecho mais marcante da abertura, tema principal que retorna ao longo da peça, são marcados por um lirismo triste que cresce e desemboca em sons marcantes. Toda essa estrutura da abertura ditará as idéias musicais que virão a seguir. É como uma exposição, um resumo da história, que será revista no decorrer dos movimentos.

Só em 1842, já mais maduro, o compositor finaliza a obra, com a orquestração da abertura e a edição dos trechos que compõem a música incidental, seqüência que serve como uma espécie de trilha sonora para uma montagem da peça de Shakespeare. Além disso, emprega a famosa marcha nupcial, melodia do repertório popular extremamente conhecida por ser tocada quando a noiva entra na igreja no momento do casamento. Sonho de uma Noite de Verão apresenta uma abertura longa e outros 13 números musicais breves, entre os quais segmentos para duas vozes femininas e coro. Seu tom alegre e jovial ajuda ainda mais a caracterizá-la como uma obra de fácil apelo popular. Tanto é assim que está entre as músicas mais executadas do repertório romântico.
O scherzo, segunda parte da obra, tem a graça, a leveza e o humor que resumem bem a confusão que se instala na floresta, narrada por Shakespeare, quando entra em cena uma poção que faz com que as pessoas se apaixonem pelo primeiro ser que observam. É inevitável, dessa forma, que os casais mais incomuns se formem e vivam, ao menos, uma única noite de verão em completa felicidade. O personagem Nick Bottom, que ganha orelhas de burro depois de ser enfeitiçado por Obrerom, é lembrado no scherzo pelo desenvolvimento das cordas que simulam o zurrar do animal. A temática bem-humorada desse trecho da história ganha contornos líricos com Mendelssohn. Isso ocorre também no noturno, movimento mais contido, mas não menos fantasioso, em que os personagens dormem enquanto são envolvidos pela magia dos seres que habitam a floresta.

Empreendedor, Mendelssohn fundou o Conservatório de Música, em Leipzig. Foi o primeiro maestro a se colocar diante da orquestra sem um instrumento, mas, sim, com a batuta. Foi também o responsável por resgatar a música de Bach. Félix Mendelssohn, não há dúvida, merece ocupar um lugar ao lado dos maiores gênios da música.

Assista, no vídeo abaixo, a abertura de Sonhos de uma Noite de Verão:

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Os sons da alma do povo russo

Um gnomo, catacumbas, um carro de boi, um velho castelo, a feira de Limoges, o Jardim das Tulherias ou a discussão entre o judeu rico e o pobre são os temas dessa suíte para piano escrita em junho de 1874 pelo compositor e militar russo Modest Mussorgsky. Ao visitar uma exposição póstuma de seu grande amigo, o pintor Viktor Hartmann – morto em 1873, aos 39 anos, vítima de aneurisma cerebral -, Mussorgsky escolheu dez das telas expostas em São Petersburgo como inspiração. Escreveu uma música para cada um dos quadros e uniu a composição por meio de um tema central e quatro intermezzi (variações sobre a mesma melodia) aos quais deu o nome de Promenade – “passeio”, em francês, que representa o trajeto dos visitantes pela mostra.

Quadros de uma Exposição foi composta na segunda metade do século 19, quando o piano ainda era bastante explorado como instrumento virtuosístico. Por sua organização diferenciada, a obra permaneceu praticamente ignorada por vários anos, embora compositores como o francês Claude Debussy tenham dedicado tempo considerável no estudo dessa suíte. Para a consagração da obra e popularidade póstuma de Mussorgsky, ela dependeu do apoio de outro russo, Sergei Koussevitzky, o maestro. Foi Koussevitzky, mestre do regente brasileiro Eleazar de Carvalho, quem encomendou ao francês Maurice Ravel uma nova orquestração para a peça. Sem conhecer as orquestrações concebidas pelo próprio Mussorgsky para a obra, Ravel criou, em 1922, sonoridades instrumentais precisas, bem acordadas com o espírito de cada um dos temas escritos para os quadros.

As peças de Quadros de uma Exposição foram compostas com significativa influência de temas folclóricos russos. Modest Mussorgsky, nascido em 1839, na vila de Karevo, era conhecido por integrar o movimento do Grupo dos Cinco (em russo, Mogutchaia Kutchka, ou seja, Grupo Poderoso), ao lado dos músicos Mily Balakirev, seu mestre, Aleksandr Borodin, César Cui e Nikolai Rimsky-Korsakov, cuja proposta nacionalista era criar uma identidade musical russa, de forma a “salvaguardar a pátria” da contaminação das escolas ocidentais, como, por exemplo, a ópera italiana. Na Escola Livre de Música, criada pelo próprio Balakirev, o Grupo dos Cinco tinha como missão ser uma oposição estilística ao ocidentalizante Conservatório de São Petersburgo, dirigido por Anton Rubinstein.

Após uma crise nervosa, em 1858 Mussorgsky – que teve sólida formação pianística, mas jamais se aprofundou nos estudos de teoria musical – abandonou a carreira militar na Academia de São Petersburgo. Deixou também o cargo de escrivão no Ministério das Comunicações. Com a morte da mãe, em 1865, tornou-se alcoólatra. Sua saúde física e mental ficou extremamente debilitada em pouquíssimo tempo. Um dos maiores nomes da música russa e precursor do modernismo morreu em 1881, uma semana depois de completar 42 anos.

Mussorgsky é um dos meus compositores favoritos e Quadros de uma Exposição é uma obra-prima que vale a pena ser escutada com atenção e com o coração e mente abertas. Boris Godunov é outra composição que adoro e que espero apresentá-la a vocês, leitores, em outro post. Fiquemos com um trecho de Quadros de uma Exposição:


quarta-feira, 14 de abril de 2010

Não há quem resista


Conhecida mundialmente como uma das mulheres mais bonitas de todos os tempos e considerada a loira mais famosa de Hollywood, Marilyn Monroe, nome artístico de Norma Jean Baker, foi uma mulher que abalou muitos corações mundo afora, incluindo em suas conquistas muitos homens poderosos como o dramaturgo Arthur Miller e o ex-presidente estadunidense John Kennedy.

Símbolo de sensualidade e um ícone de popularidade no século XX, Marilyn começou a carreira em alguns pequenos filmes, mas a sua habilidade para a comédia e a sua sensualidade, levaram-na a conquistar papéis em filmes de grande sucesso, tornando-a numa das mais populares estrelas de cinema dos anos 50. Sua aparente vulnerabilidade e inocência, junto com sua inata sensualidade, a tornaram querida no mundo inteiro.

O primeiro papel de Marilyn no cinema foi uma participação em Sua Alteza, a Secretária, em 1947. Contracenou rapidamente com Groucho Marx em Loucos de Amor, em 1950. Nesse mesmo ano conseguiu um pequeno papel no thriller O Segredo das Joias, e o papel de Claudia Caswell em A Malvada, estrelado por Bette Davis. No entanto, foi sua performance em Torrentes de Paixão, em 1953, que a tornou estrela. Marilyn fez o papel de Rose Loomis, uma jovem e bela esposa que planeja matar seu velho e ciumento marido, personagem de Joseph Cotten.

O sucesso de Marilyn em Torrentes de Paixão lhe rendeu, no mesmo ano, os papéis principais em Os Homens Preferem as Louras e Como Agarrar um Milionário. Em 1959, Marilyn brilhou em Quanto Mais Quente Melhor, de Billy Wilder, e teve seu trabalho reconhecido ao vencer o Globo de Ouro de "Melhor Atriz em Comédia".

Em 1956, Marilyn casou-se com o dramaturgo Arthur Miller. Amigos disseram que ela o deixava de "joelhos bambos". Enquanto eles estavam casados, em 1961, Arthur escreveu o papel de "Roslyn Taber" de Os Desajustados, especialmente para Marilyn. Dirigido por John Huston e coestrelado por Clark Gable e Montgomery Clift, este acabou sendo o último filme completo de Marilyn e a despedida das telas de Gable.

Marylin já tinha tido encontros amorosos com John Kennedy muito antes dele entrar na Casa Branca. Kennedy ficara obcecado por ela durante sua recuperação de uma operação na coluna que o deixou imobilizado. O caso entre eles teve início depois de seu divórcio de Vitor Baggio e continuou enquanto ela esteve casada com Miller. Apesar de suas ilusões, Marilyn sabia que Kennedy desejava apenas a estrela cintilante de cinema, não a mulher que era. Ele pretendia livrar-se dela com elegância. Em seu aniversário, Marylin cantou com voz lasciva "Feliz aniversário, senhor presidente". John Kennedy disse: "Já posso me retirar da política, depois de ter ouvido este feliz aniversário cantado para mim de modo tão doce e encantador."

Seu fim aconteceu na manhã do dia 5 de agosto de 1962. Aos 36 anos, Marilyn faleceu enquanto dormia em sua casa em Brentwood, na Califórnia. A notícia foi um choque, propagado pela mídia, explorando sobretudo o caráter misterioso em que o fato se deu, prevalecendo a versão oficial de overdose pela ingestão de barbitúricos. O brilho e a beleza de Marilyn faziam parecer impossível que ela tivesse deixado a todos. Ninguém sabe de fato o que aconteceu naquela noite.

Assista no vídeo abaixo, a inesquecível Merylin Monroe cantando "I Wanna Be Loved By You", cena do filme Quanto mais quente melhor:

Mais admirado do que Maradona


Carlos Gardel foi o mais famoso dos cantores de tango argentino. Foi compositor, intérprete e ator de inúmeras canções e musicais. Ainda hoje, a Argentina reverencia Gardel tanto quanto o jogador de futebol Diego Maradona. Não há um único cidadão argentino que não tenha profunda admiração por esses dois ídodos do país do tango.

Com Carlos Gardel o cadenciado ritmo portenho ganhou uma faceta mais romântica e deu volta ao mundo. Gardel foi um personagem emblemático em vida e continua sendo, potenciado pela ascendente projeção afetiva e social de sua legendária memória.

Lendária também é a questão de onde teria nascido o famoso cantor. Alguns sustentam que Gardel teria nascido no interior do Uruguai no departamento de Tacuarembó baseando-se em alguns documentos e matérias jornalísticas de época. Seria filho do líder político local Carlos Escayola e de Maria Lelia Oliva, que tinha 13 anos. Outros dizem que Gardel teria nascido na cidade francesa de Toulouse como Charles Romuald Gardès, filho de pai ignorado e de Berthe Gardès. Gardel, na verdade, gostava de toda essa polêmica e morreu deixando este ponto de interrogação. Quando perguntavam sobre o tema, dizia: "Nasci em Buenos Aires aos dois anos e meio de idade".

Iniciou-se como cantor ainda jovem, aos 17 anos, com o nome artístico de El Morocho, apresentando-se em cafés dos subúrbios da capital argentina. Sua primeira interpretação formal se dá no Teatro Nacional de Corrientes, no qual também se apresenta Don José Razzano, cantor uruguaio, com quem formou uma parceria por vários anos.

No ano de 1925, Gardel já era popular em toda a América espanhola. Em 1927 foi o ano da sua consagração na Europa, alcançando grande sucesso em Paris. Logo viriam Estados Unidos e o cinema. Nos estúdios da Paramount, em Nova York, atuou em vários filmes que fizeram grande sucesso e estenderam ainda mais a sua lenda. Alguns dos maiores sucessos de Gardel no cinema foram Flor de Durazno, El tango en Broadway, The Big Broadcast Of e Luces de Buenos Aires.

No dia 24 de junho de 1935, Gardel morreu num desastre aéreo, no auge da carreira e da fama, em Medellín, Colômbia. O mito de Gardel atravessou vigorosamente todo o século. Hoje representa um verdadeiro ícone do tango e continua sendo uma das personalidades mais queridas de toda a Argentina. Seus seguidores costumam dizer que ele "canta cada dia melhor".

terça-feira, 13 de abril de 2010

O gênio da ópera

“Napoleão morreu, mas um novo conquistador já se revelou ao mundo. E de Moscou a Nápoles, de Londres a Viena, de Paris a Calcutá, seu nome está em todas as bocas. A fama desse herói não tem fronteiras, a não ser as da própria civilização.” É assim que o escritor francês Stendhal abre A Vida de Rossini, a primeira biografia sobre o italianíssimo Gioacchino Rossini.

Rossini foi uma figura única no mundo da música. Em sua vida, compôs algumas das mais geniais óperas da história e, apesar disso, parou de escrever muito jovem, aos 37 anos. Em menos de 25 anos de trabalho efetivo, escreveu 34 óperas, dentre elas as mais famosas e divertidas óperas cômicas de todos os tempos. Poucas vezes um compositor teve tanto senso de palco e de comicidade quanto Rossini. Foi o mais talentoso continuador de uma escola operística italiana que buscava a inspiração na melódica e tinha a preocupação cênica em relação à música. Entretanto, ele foi capaz de transportar seu caráter para sua obra. A alegria de sua música, o esplendor de seus conjuntos, suas brincadeiras rítmicas e onomatopaicas nunca forma igualados. Em função disso, teve a simpatia do público e o apoio de grandes nomes, como Stendhal e Balzac.

E aqui está uma das maiores dificuldades ao interpretar sua obra: trazer à tona toda essa alegria, toda essa leveza, sem perder de vista a seriedade de sua escrita, a qualidade de sua instrumentação e a transparência de sua textura vocal e orquestral, somente comparável à de Mozart.

O Barbeiro de Sevilla, obra-prima de Rossini, conta a história do barbeiro e faz-tudo de Sevilla no século 18, Fígaro, que faz as vezes de cupido no amor entre o Conde de Almaviva e Rosina, tem uma série de imbróglios e situações hilárias, para terminar com os amantes unidos e o final previsivelmente feliz, na ópera cômica mais popular da história ocidental.

Para quem assistia ou ainda assiste aos desenhos animados, O Barbeiro de Sevilla está eternizado em um episódio de Pica-Pau, com o protagonista a cantar a cavatina de Fígaro, Largo al Factotum, uma das árias mais populares de todos os tempos. Há também menções à ópera em outros desenhos animados, como Pernalonga, Tom e Jerry e até mesmo nos Simpsons, no episódio O Homer de Sevilla. Confiram um trecho da ópera cantada pelo Pica-Pau no vídeo abaixo:

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Romântico, ma non troppo

Chopin é para mim a personificação do período romântico. Doente, apaixonado, pessoal e lírico, dedicou sua vida e música ao piano de uma forma nunca antes vista. Ao sair da Polônia e adotar a França como seu novo país, Chopin se tornou um dos primeiros nacionalistas. As polonaises e mazurkas que compôs trazem elementos eslavos à sua escrita rebuscada e elegante do piano.
Mesmo com todo o reconhecimento de Beethoven e de Mozart, nunca um compositor fora considerado tão popular quando Frédéric François Chopin. Grande parte dessa aceitação pelo público pode ser creditada a uma forma criada – segundo alguns, adaptada – pelo compositor polonês: a balada.

Em 1836, quando Chopin lançou a primeira das quatro que compôs, a balada era um gênero diverso. A forma então em voga havia sido criada pelo organista alemão Karl Loewe, e suas primeiras peças tinham sido compostas havia menos de 20 anos, em 1818. Elas eram concebidas para ser cantadas com acompanhamento de piano e contar uma história épica. A inventividade de Chopin consistiu em criar baladas exclusivamente para piano.

Concluídas em sete anos, as quatro baladas peças relativamente curtas se comparadas com os padrões da época e distinguem-se de suas antecessoras por serem uma seqüência de estados psicológicos. Reflexo do período em que foram elaboradas, o romantismo, as baladas de Chopin são a síntese do turbilhão de sentimentos do autor.

Em 1843, Chopin concluiu, enfim, sua última balada, considerada por muitos sua obra-prima. É com a Balada número 4 em Fá Menor op. 52 (que você pode ouvir no vídeo abaixo) que o autor consegue externar musicalmente seus sentimentos de forma mais intensa. Carregada pelo amadurecimento e pelo virtuosismo de Chopin, a peça é a que mais exige pleno domínio da técnica para ser interpretada. Assim como o restante da obra, concebida durante o período romântico, as baladas de Chopin sempre jogaram com diversos planos sentimentais. Sua música “canta” a alma, que subitamente transforma alegria em tristeza, e vice-versa.

Chopin dá voz ao piano. Por meio de suas notas, ele foi capaz de materializar sentimentos que o público até então desconhecia. Seus concertos para piano possuem grande liberdade, principalmente nos movimentos lentos, expressão máxima de seu lirismo. Mas, ao mesmo tempo, é algo natural, pois sua música flui do sentimento. Dele deve partir e nele devemos chegar.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Sensível perfeccionista


Quem nunca ouviu falar no famoso Bolero de Ravel? Para muitos, é a peça francesa mais executada de todos os tempos. A obra de Maurice Ravel não se restringe somente ao Bolero. Compositor e pianista igualmente brilhante, ele viveu a transição do século 19 para o 20 em pleno romantismo tardio, identificando-se com os compositores e a música de seu país, a França. Influenciado por Debussy, além de sua declarada paixão por Mozart, a delicadeza e a sutileza de suas melodias o colocaram em posição de grande destaque no impressionismo.

De personalidade discreta, apesar da elegância que beirava o dandismo, Ravel imprimia em suas músicas um refinamento preciso. Sabia escolher, como poucos, o instrumento adequado para cada situação. Nascido próximo à fronteira com a Espanha, Ravel adotou diversas vezes em seu trabalho temas do país vizinho. Apesar do nome, o Bolero se assemelha mais a outra dança espanhola, a passacale, derivada de um ritmo trazido das índias.

A passacale foi bastante modificada na França, mas em Ravel volta às raízes. A característica melodia repetitiva foi levada ao extremo pelo compositor: o tema do Bolero quase não varia, incansavelmente executado por aproximadamente 15 minutos, dependendo da interpretação. A caixa-preta (instrumento de percussão na forma de um tambor raso) marca o ritmo fazendo o papel das castanholas, tocando as tercinas (divisão de uma batida do compasso em três mais aceleradas).

Houve quem não compreendesse que a genialidade da obra está na sua forma de manter o interesse por uma melodia sem variação. Na estréia, em Paris, a coreografia da russa Bronislava Nijinska provocou escândalo. Uma espectadora saiu no meio da apresentação exclamando que Ravel estava “louco”. Sem perder a pose, o compositor disse que ela havia “compreendido a obra”. Pouco tempo depois, se manifestaria os primeiros sintomas de uma doença neurológica degenerativa que lhe afetaria os movimentos e a fala até a morte.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Mozart e a maior de todas as óperas


Sob qualquer ponto de vista, as façanhas de Wolfgang Amadeus Mozart impressionam. Mal saído dos cueiros, antes mesmo de falar, já tocava piano. Aos 4 anos, compôs sua primeira peça para o instrumento. Aos 9, escreveu a primeira sinfonia por um motivo prosaico: como estava doente, o pai, Leopold, o proibiu de tocar cravo. Entediado, usou o tempo livre distante do instrumento preferido para compor a obra. Aos 12, assinou sua primeira ópera. Aos 14, visitou com o pai a Capela Sistina, em Roma, e ali ouviu o Miserere, uma complexa obra coral a nove vozes de Gregório Allegri, cuja partitura não podia ser contemplada por uma proibição do papa. Ao voltar para casa, o garoto reproduziu toda a peça no papel. Mozart passou dez dos seus primeiros 15 anos de vida viajando por toda a Europa encantando e seduzindo reis e nobres.

Em 1787, Mozart compôs a ópera que é considerada por muitos como a maior de todas. “Amanhã teremos a estréia e você nem sequer compôs a abertura!”, comentou com Mozart um de seus amigos. Fazendo-se de nervoso, o compositor austríaco correu para o seu quarto e começou a compor à meia-noite. Com a mulher, Constanze, contando-lhe histórias para que não dormisse, terminou, em menos de três horas, Don Giovanni, sua ópera mais louvada. Talvez essa história seja apenas uma lenda – assim como a que conta que, no primeiro ensaio, insatisfeito com o grito que a soprano Teresa Bondini soltava quando o sedutor Don Juan investia contra sua honra, o próprio Mozart beliscou-lhe a perna: “Isso mesmo! É assim que quero”, teria dito. No entanto, considerando-se a personalidade de Mozart, são episódios que podem muito bem ter ocorrido.
Don Giovanni é a mais dramática das óperas de Mozart. Nela, ele mistura um herói-vilão, vítimas com sentimentos contraditórios e a vingança do sobrenatural, introduzindo o terror do universo da música clássica. Instalados em hospedarias em lados opostos da mesma rua, Mozart e o italiano Lorenzo Da Ponte, que escreveu o libreto (o texto da ópera), acertavam os detalhes finais da obra pela janela.

Em Mozart, toda a sua música tem a pureza, a beleza, a inocência e a simplicidade de uma criança. Músicos do mundo inteiro reconhecem que o austríaco é o compositor mais difícil de tocar, exatamente por esse motivo.

Assista, no vídeo abaixo, um dos trechos da ópera Don Giovanni:

sábado, 3 de abril de 2010

Vai encarar?

O rugby, apesar de pouco conhecido no Brasil (para quem não sabe, nós temos sim uma seleção nacional, mas é saco de pancada dos chilenos, paraguaios, uruguaios e argentinos), é bastante difundido no mundo. É o principal esporte da Oceania, onde países pequenos como Tonga e Fiji possuem fortes times nacionais; tem ampla difusão na Grã-Bretanha e França, e também a seleção da África do Sul é fortíssima.

Mas os All-Blacks, como é conhecida a seleção de rugby da Nova Zelândia, sempre se destacam, por seu estilo feroz e agressivo, e durante anos dominaram – e ainda dominam – mundialmente o esporte. Seus jogadores encaram o desafio como uma guerra, e parte disso pode ser explicado numa única palavra: Haka.

Haka é o nome genérico dado à dança dos maoris, o povo que ocupava as ilhas neozelandesas quando os ingleses chegaram. Para os maoris, a dança complexa do Haka é uma expressão da paixão, vigor e identidade da raça, de certa forma, a boa performance ajuda a manter a reputação tribal. E os jogadores dos All-Blacks não fogem à regra, pois antes de qualquer jogo, desde o início do século, fazem a dança do Haka em frente aos adversários. Os estádios silenciam para ouvir. Os jogadores adversários se perfilam, em pose desafiadora, para fazer frente. Pode-se observar nos rostos e gestos dos neozelandeses a expressão da paixão invocada, do espírito de guerreiro que o Haka incorpora em quem o pratica. E assim os All-Blacks se tornaram notórios ao longo dos anos, tornando-se uma equipe pra lá de temida e vitoriosa no mundo do rugby.

Existem diversas versões do Haka, mas a mais clássica delas é a “Ka mate”, cuja origem data de 1810, quando o chefe tribal Te Rauparaha, estava sendo perseguido por inimigos, e milagrosamente escapou, escondendo-se em uma saia de mulher. Ao sair, havia um homem a sua espera, mas era um chefe amigo, e vendo isso, Te Rauparaha fez o Haka, celebrando a vitória da vida sobre a morte, o que serve de inspiração para os All-Black.

A tradução do “Ka mate”
Ringa pakia! (Bata as mãos nas coxas)
Uma tiraha! (Estufe o peito)
Turi whatia! (Dobre os joelhos)
Hope whai ake! (Deixe o quadril seguir)
Waewae takahia kia kino! (Bata o pé o mais forte que puder)
Ka mate, ka mate (Eu vou viver, eu vou viver ?)
Ka ora, ka ora (Eu vou morrer, eu vou morrer ?)
Tēnei te tangata pūhuruhuru (Este é o homem peludo que está em pé aqui)
Nāna nei i tiki mai whakawhiti te rā …(Que trouxe o sol e o fez brilhar)
Ā upane, ka upane (Um passo para cima, outro passo para cima)
Ā upane, ka upane (Um passo para cima, outro passo para cima)
Whiti te rā, hī! (O sol brilha)