quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Rigor da música serial do dodecafonismo

Desde o fim do século 19, várias compositores ultrapassaram a fronteira da tonalidade – sistema tradicional de hierarquização de notas musicais em que umas predominam sobre outras no conjunto da melodia e da harmonia. Na década de 1920, aconteceu a radicalização: o austríaco Arnold Schoenberg desenvolveu um método de composição que dá o mesmo peso às 12 notas da escala ocidental (as sete que são padrão, além das cinco de tons intermediários – sustenido ou bemol). No lugar da harmonia tonal, cada obra seria elaborada a partir de uma série, uma ordenação predefinida dessas notas, que não podem se repetir antes que as outras 11 sejam tocadas. Começava aí o dodecafonismo serial, método que transformaria a música de vanguarda nas décadas seguintes.

O austríaco Alban Berg (1885-1935) foi aluno de Schoenberg. Era também influenciado pela obra do conterrâneo Gustav Mahler e do romantismo tardio. Para o filósofo alemão Theodor Adorno, o grande mérito de Berg foi revelar que a linguagem musical de Schoenberg não representava um sectarismo, mas uma evolução a partir de Mahler, do francês Claude Debussy e outros compositores da geração anterior.

Berg desfrutava de certa popularidade nos anos anteriores à sua obra derradeira, o Concerto para Violino (1935). No entanto, o nazismo – que refutava a idéia universalizante da música serial – proibiria a execução de suas obras na Alemanha e na Áustria, levando-o a sérias complicações financeiras. Foi a morte precoce de Manon Gropius que levou Berg a compor a obra. A filha de Alma Mahler (ex-esposa de Gustav Mahler) com o arquiteto alemão Walter Gropius morrera repentinamente, e o compositor pediu permissão a Alma para dedicar o concerto “à memória de um anjo”. Em poucos meses, finalizou a composição.

Para Berg, o uso da série dodecafônica não deveria ser visto apenas como a aplicação de uma sucessão regular de intervalos entre as notas. Os rascunhos desse concerto mostram sua preferência por temas reconhecíveis, que sugerem contornos melódicos. Além disso, submeteu a série a implicações harmônicas e tonais, criando o que depois seria chamado de “centros tonais”: momentos em que a composição, serial, poderia se identificar com uma tonalidade.

Ao longo do Concerto para Violino, são feitas duas citações literais de uma canção popular austríaca. Já o último movimento abre com variações seriais sobre o coral Es ist genug (Basta), do alemão Johann Sebastian Bach, que trata da alma se desencarnando. O arranjo dessa seqüência, para três clarinetes e um clarinete-baixo, emula o órgão de uma igreja, completando um ciclo de vida alegre, sofrimento na doença e transfiguração após a morte. O gosto de Alban Berg pela referência e pela alusão é fator que diferencia sua obra da dos compatriotas Schoenberg e Anton Webern. Dos três participantes da chamada Segunda Escola Vienense, Berg foi o que melhor soube agregar o lirismo ao rigor da composição serial.

Ouça um trecho do Concerto para Violino de Alban Berg interpretado pela virtuosa violinista alemã Anne-Sophie Mutter que é uma das grandes intérpretes da obra:

Um comentário:

  1. Obrigado por engrandecer mais meu conhecimento sobre música. Adoro este blog, sou teu fã Aline Veras.

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