sábado, 15 de janeiro de 2011

Luciano Berio, um compositor de vanguarda

O grande diferencial da obra do italiano Luciano Berio (1925-2003) em relação à de seus contemporâneos está na riqueza de sua música vocal. As Folk Songs juntam dois dos materiais preferidos de Berio: a música popular tradicional, reinterpretada por conceitos contemporâneos, e a voz feminina da meio-soprano (a imediatamente menos aguda que a soprano). No caso, uma em especial: a da estadunidense Cathy Berberian, sua primeira esposa.

Berio fez parte da inovadora geração do pós-guerra na Europa. Nesse período, nomes como o francês Pierre Boulez, o alemão Karlheinz Stockhausen e o italiano Luigi Nono retomaram o método da Segunda Escola Vienense – formada por Alban Berg, Arnold Shoenberg e Anton Webern – e de outros autores de décadas anteriores. A renovação da metodologia sistemática da tríade austríaca levaria a música serial – a que se planeja rigidamente em séries de notas de igual importância – ao extremo da organização. Luciano Berio foi um entusiasta desse movimento; depois, como muitos, tomou outro caminho. Para ele, “havia a necessidade, para alguns, de rejeitar a história e, para outros, mais responsáveis, relê-la e de não mais aceitar nada às cegas”.

Foi assim que o italiano passou a privilegiar o pensamento do processo musical, não mais a forma ou o método. Nos anos 1950, atuou na linha de frente da música eletroacústica – a que se utiliza de meios eletrônicos – com Bruno Maderna no Estúdio de Fonologia Musical de Milão. A possibilidade de usar e manipular materiais pré-gravados ampliava o horizonte da música. Foi por isso que, em vez de se limitar aos experimentos de ponta, Berio abandonou o uso tradicional de seus materiais para adotar uma postura iconoclasta e de bricolagem. Fitas magnéticas, instrumentos tradicionais, melodias populares, séries dodecafônicas: tudo interessava a ele.

As Folk Songs, de 1964, são o mais célebre trabalho de Berio com música popular. Grande parte das 11 canções é de domínio público. No entanto, Ballo e La Donna Ideale, de 1946, são composições de Berio inspiradas na música popular italiana. Já Black Is the Color e I Wonder as I Wander são adaptações do folclorista estadunidense John Jacob Niles para temas tradicionais.

O grande trabalho do compositor italiano foi rearranjar as canções de modo a extrair as “raízes expressivas” de cada uma delas. Berio mudou ritmos e andamentos, criou novas harmonizações e alterou relações entre letra e música tanto na sonoridade como na parte semântica. Com o arranjo para sete instrumentos (flauta, harpa, clarineta, viola, violoncelo e duas percussões), deu coesão a músicas de origens distintas, como da Armênia e do Azerbaijão.

A grande estrela das Folk Songs é a meio-soprano. Não à toa, Berio dedicou-as a Cathy Berberian, ainda que estivessem se divorciando. Cathy foi pioneira na exploração de novas possibilidades vocais e era dotada de expressividade ímpar. Luciano a chamava de “seu segundo instituto de fonologia”.

Um comentário:

  1. Ahahaha, antes de começar a ler o post já imaginei que a cantora fosse armênia. O sobrenome não nega :-)

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