Foi uma toada a marca mais profunda que o “rei do baião” deixou na música popular brasileira. Asa Branca é uma imagem, o retrato definitivo de uma realidade perene. De Luiz Gonzaga, o folclorista Luís da Câmara Cascudo dizia que era o cantor do Nordeste seco: “Paisagem pernambucana, águas, mato, caminhos, silêncios, gente viva e morta”. Entre suas canções sobre a seca e o sertão, Asa Branca é provavelmente a mais bem-acabada e, sem dúvida, a mais popular.
A asa-branca é uma pomba parda que, durante o vôo, revela uma faixa branca em suas asas. Diz a tradução nordestina que, quando ela abandona o sertão, é sinal de que a seca será dura. “Quando olhei a terra ardendo/ Qual fogueira de São João/ Eu perguntei a Deus do céu, uai/ Por que tamanha judiação” são os primeiros versos da composição. Asa Branca foi pioneira em trazer para as rádios a realidade do sertão. Em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, Gonzagão declarou que até havia sido chamado na época para prestar “esclarecimentos” sobre a letra aos funcionários da censura.
Precursora das músicas de protesto? Luiz Gonzaga dizia que sua composição era “um protesto”, “um protestozinho cristão, puramente nosso”. Asa Branca abordava um problema social que só viria a se agravar – o êxodo de milhares de sertanejos. Dizer que Luiz Gonzaga foi um ativista seria exagero. Compôs jingles para políticos identificados com a tradição latifundiária no Nordeste e até um em homenagem a Jânio Quadros na época em que ele se elegeu presidente.
Luiz Gonzaga revelou certa vez que Asa Branca não era uma criação original sua. Na verdade, melodia e letra teriam sido inspiradas em uma música tradicional que ouvia quando criança. Ele teria apenas aprimorado a harmonia e inserido partes da letra. Embora o registro de autoria da música possa ser questionado, não se pode negar a importância da gravação na disseminação da cultura de origem nordestina.
Em depoimento a Miguel Ângelo de Azevedo, Humberto Teixeira, parceiro em mais de 20 músicas com Gonzaga, contou que, durante as gravações, muita gente não gostou de Asa Branca. Acostumados com as músicas alegres e dançantes de Gonzaga, os músicos que participaram do registro chamaram-na de “moda de igreja”. Passaram até o pires no estúdio, com uma vela de novena, caçoando dos autores. Segundo Humberto, “mal sabiam eles que nós estávamos gravando ali uma das páginas mais maravilhosas da música brasileira”.
Em homenagem ao nosso “rei do baião”, Luiz Gonzaga, e aos nordestinos espalhados em todo o mundo, aqui vai Asa Branca, o hino do Nordeste brasileiro:
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